segunda-feira, junho 07, 2004

O cowboy que venceu a Guerra Fria



Dia 05 de junho, vítima do mal de Alzheimer há dez anos, faleceu Ronald Reagan, que chegou a afirmar que a doença o levaria numa viagem ao crepúsculo de sua vida. Presidindo os EUA de 1981 a 1988, esse filho de um vendedor de sapatos alcoólatra conseguiu deixar sua marca na história, vindo a ser todo um símbolo do Partido Republicano e do conservadorismo americano, mesmo estando filiado ao Partido Democrata até 1962.

Entretanto, inicia sua vida política como Governador da Califórnia, em 1966, pelo Partido Republicano, sendo reeleito em 1970. Em 1976, disputa a indicação presidencial republicana com Gerald Ford, sendo derrotado. Ford perderia a eleição presidencial de 1976 para o democrata Jimmy Carter. Reagan foi eleito Presidente dos EUA em 4 de novembro de 1980, vencendo o democrata Jimmy Carter que buscava a reeleição, ganhando as eleições em 43 dos 50 estados americanos.

O ex-Governador da Califórnia tinha então 69 anos e foi o Presidente mais velho dos EUA. Em 30 de março de 1981 sofreu um atentado a bala, na saída do hotel Hilton em Washington. Recuperando-se, governa seu país e é reeleito em 1984, na vitória mas completa de um Presidente dos EUA, depois de invadir a ilha caribenha de Granada, governada por uma junta comunista. Reagan, em sua reeleição em 1984, conseguiu o voto até da maioria dos filiados às grandes centrais sindicais americanas.

Quando Reagan assume o poder nos EUA e devolve ao povo americano o otimismo perdido, a presidência atravessava seu período mais sombrio. John Kennedy havia sido assassinado, Lyndon Johnson havia renunciado candidatar-se a reeleição por causa do Vietnam, Richard Nixon tinha renunciado por causa do escândalo Watergate e o país se encontrava humilhado pela tragédia dos reféns no Irã, diante da impotência de Jimmy Carter.

Considerado um péssimo ator, Ronald Reagan marcou uma época nos EUA e no mundo. A política ultra-liberal de seu governo acaba por fim com o que havia restado do New Deal de Roosevelt, cortando impostos e aumentando o déficit orçamentário. Com o lema “O Governo é o problema e não a solução”, Reagan cortou 25% dos impostos, aumentou os gastos militares e diminuiu o gasto com programas sociais, resultando num aumento do déficit orçamentário que no final de seu mandato chegava a 175 bilhões de dólares. As desigualdades sociais dispararam, esquecidas diante da bonança macroeconômica. Seu governo fez a economia americana crescer a uma media de 3% ao ano, criando no período de oito anos algo em torno aos 15 milhões de empregos e baixando a taxa de inflação de 13,5% em 1980 para 3,7% em 1988.

Junto à primeira-ministra britânica Margaret Thatcher construiu uma aliança política Anglo-americana com forte base econômica, que lançou a doutrina do neoliberalismo. Foi ela, que discursará no funeral, quem lhe aconselhou a confiar em Gorbatchev. Em contrapartida, Reagan apoiou a Grã-Bretanha na guerra das Malvinas contra Argentina.

Durante o primeiro mandato de Reagan não houve uma aproximação aos líderes soviéticos. Entretanto, a partir de 1985, com a chegada de Mikhail Gorbatchev ao poder, a amizade de ambos levou à realização de três conferências bilaterais, e à firma em 1987 do primeiro acordo bilateral de desarmamento nuclear. O resultado prático desse acordo foi a retirada dos mísseis de alcance médio da Europa.

Os anos Reagan se confundem com o fim da Guerra Fria. No seu governo, os EUA se rearmam num último desafio a então União Soviética, denominada Império do Mal (Evil Impire) por Reagan. O auge desta corrida armamentista ocorre com o programa “Guerra nas Estrelas”, quando os gastos militares chegaram a mais de 250 milhões de dólares em 1985. Os grandes gastos impostos aos soviéticos pelo rearmamento americano precipitaram a quebra da URSS e o fim do bloco comunista.

A Doutrina Reagan foi aplicada para apoiar as guerrilhas anti-comunistas na Nicarágua, no Afeganistão. Apoiou o governo de El Salvador durante os anos da revolta comunista. Invadiu a pequena ilha de Granada em outubro de 1983. Aprovou o envio de armas ao Irã, em contra de sua política externa, e o lucro obtido com esse comércio financiou a guerrilha dos “Contra” nicaragüenses.

São famosas as gafes protagonizadas por Reagan, como quando em visita oficial ao Brasil em 1983, disse que estava muito feliz de estar na... Bolívia. Ou ao testar um microfone no programa semanal na radio americana, afirmou que bombardearia a URSS. Para a América Latina, Reagan foi um fiasco, bastando para tanto saber que seus anos de governo coincidem com a Década Perdida latino americana.

Diante dos temas de destaque da política interna americana, religião e aborto - por exemplo, e pressionado pela direita fundamentalista, Reagan jamais cedeu. Ele se identificava com o americano médio, a quem acreditava representar, e sentia que este não entenderia seu apoio a temas de extrema direita.

Reagan, assim como a Sra. Thatcher, criaram uma escola que influenciou aos seus sucessores e a diversos governantes no mundo. O próprio Partido Democrata estremeceu ao ouvir o Presidente Bill Clinton decretar, no discurso sobre o estado da União de 1994, o fim do estatismo e da intervenção governamental na vida dos cidadãos.

Líder da revolução conservadora – cultural, política e econômica - dos anos oitenta, Ronald Reagan – o 40º Presidente dos EUA - foi o grande vencedor da Guerra Fria, quer queiramos ou não. Reagan foi o Presidente dos EUA que melhor soube tirar proveito da mídia, desde John Kennedy. Por personificar o “sonho americano”, Reagan possuía uma tremenda popularidade nos EUA, apesar de sua notória falta de cultura, somente superada por Bush Jr.


O cowboy que venceu a Guerra Fria, pois o muro de Berlim caiu apenas 10 meses depois do fim de seu segundo mandato, possuía muitos assessores e dentre esses muitos falcões. Entretanto, somente prestava atenção em uma única conselheira: sua mulher, Nancy.