segunda-feira, julho 12, 2004

A nova conquista lusíada

Quem te sagrou criou-te português
Do mar e nós em ti nos deu sinal.
Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez.
Senhor, falta cumprir-se Portugal!

Fernando Pessoa,
em “Poemas Escolhidos”,
Segunda Parte/ Mar Português, I- O Infante.

Se o ano de 2003 representou para Portugal uma terrível lembrança – por uma série de escândalos que abalaram o país, este 2004 promete ser o grande ano português. Depois da comemoração dos 40 anos da Revolução dos Cravos, de organizarem a melhor Eurocopa dos últimos tempos – inclusive chegando na final, Portugal acaba de receber a notícia de que o Conselho extraordinário da União Européia, designou, por unanimidade, o conservador Primeiro-Ministro português Durão Barroso como futuro Presidente da Comissão Européia, para o mandato de 1 de novembro de 2004 a 31 de outubro de 2009.

Claro que a indicação será submetida ao pleno do Parlamento Europeu, em Estrasburgo, França, no próximo dia 22 de julho, mas já se sabe que será aprovado, ainda que por maioria simples, convertendo a Barroso Durão no 11º Presidente da Comissão Européia. A indicação de Durão Barroso acaba com um suspense que perdurou por várias semanas, e que subiu a temperatura política portuguesa.

José Manuel Durão Barroso, nascido em Lisboa em 1956, na juventude flertou com os maoístas, antes de se converter no herdeiro político do conservador ex primeiro ministro Aníbal Cavaco e Silva, que governou Portugal de 1985 a 1995. Como Ministro de Relações Exteriores do governo Cavaco e Silva, então com 36 anos, Durão Barroso conseguiu a façanha de acabar com a guerra civil em Angola, conseguindo a firma de um acordo de paz histórico. A grande maioria dos políticos portugueses, tanto de seu partido como os de oposição, são unânimes em lhe atribuir como maior característica a ausência total de carisma. Formado em Direito pela Universidade de Lisboa, da qual foi professor, especializou-se em Relações Internacionais e Ciências Políticas, tendo lecionado nas Universidades de Genebra, na Suíça, Georgetown, nos EUA, e Lusíada, em Lisboa.

Assim, Durão Barroso vai suceder a Romano Prodi. Político de direita, foi anfitrião do Presidente dos EUA na Conferência dos Açores, apoiando sua intervenção militar no Iraque. A nível europeu, segue as posições espanholas conservadoras, capitaneadas por José Maria Aznar, ex-Primeiro Ministro espanhol.

O problema doméstico surgido com a futura renúncia de Durão Barroso decorre do fato de que o Presidente da República Jorge Sampaio é de esquerda, e o Primeiro-Ministro de direita. De maneira que Durão Barroso só aceitaria ir-se a Bruxelas, se o Presidente Sampaio não dissolvesse o Parlamento português e convocasse novas eleições, aceitando assim a indicação de um novo Primeiro-Ministro pelas forças coligadas de direita, que atualmente são maioria no Parlamento e governam, também, a cidade de Lisboa.

De acordo com a Constituição portuguesa, cabe ao Presidente República decidir, no presente caso, se adianta a eleição ou nomeia um Primeiro-Ministro indicado pelo partido mais votado nas últimas eleições, no caso, as eleições de 2002 que elegeram a Durão Barroso, do conservador Partido Social Democrata – PSD. A esquerda preferia a primeira opção, isto é, que sejam convocadas novas eleições, principalmente diante da derrota dos conservadores nas eleições européias.

Preocupado com a estabilidade do país, o Presidente Sampaio optou por aceitar, muito a contragosto, a indicação feita pelos conservadores do Prefeito de Lisboa e Vice-Presidente do partido de Durão Barroso, Pedro Santana Lopes, considerado pela imprensa portuguesa como um político populista, ao estilo do italiano Berlusconi. A escolha presidencial gerou muitas reações, entre elas a demissão do secretário-geral do Partido Socialista português, Eduardo Ferro Rodrigues. Amigos a mais de 35 anos, Ferro ajudou a formar a coalizão de esquerda que elegeu Jorge Sampaio presidente de Portugal. Entretanto, o Presidente Sampaio exigiu do novo governo a manutenção das políticas atuais aplicadas para áreas que considera sensíveis, como Europa, Defesa, Justiça e as Finanças.

O Partido Popular Europeu - PPE, atualmente a maior força política no Parlamento de Estrasburgo com 278 deputados, a Eurocâmara, apoiou a candidatura de Durão Barroso desde o início, apostando no líder luso como único ponto de coesão entre as posições divergentes no seio da União Européia. Portugal participa de todas as instituições européias, notadamente do Tratado de Schengen e da Zona Euro, que agrada a Paris e Berlim. Seu atlantismo, posto que Durão Barroso apóia a política externa dos EUA, agrada a Londres.

Considerada a locomotiva da integração européia, a Comissão, composta por 25 Comissários indicados pelos países-membros com status de Ministros e atribuições bem definidas, é o verdadeiro Poder Executivo do bloco, sendo seu Presidente a máxima autoridade oficial da UE.

Junto a indicação de Durão Barroso para a Presidência da Comissão Européia, veio a confirmação do espanhol Javier Solana para o cargo de Ministro de Relações Exteriores para quando entre em vigência a Constituição Européia. Desta maneira, a península Ibérica assume um peso jamais visto nas instituições européias. E no momento histórico importante, pois este ano ocorreu a entrada de dez novos países-membros do bloco europeu, que espera ainda para este ano a aprovação de sua primeira Constituição.