segunda-feira, julho 19, 2004

O acordo hemisférico

Incluso los sistemas más competitivos
y agresivos,
deben recurrir a estrategias
de alianza e integración,
tanto hacia el exterior
como entre los miembros
de su propia comunidad.
Antonio Colomer

Em nove anos de negociação, nunca o acordo definitivo entre o Mercosul e a União Européia esteve tão próximo. Durante essa semana, a negociação entre os blocos entra em reta final para a assinatura de um acordo geral que conseguiria aplacar as metas de ambas partes, reduzindo os subsídios e abrindo o mercado europeu de produtos agrícolas ao Mercosul, e possibilitando aos países do bloco europeu participação no mercado de compras governamentais do bloco sulista. O prazo final para a assinatura do tão almejado acordo, que definirá o comércio hemisférico entre o sul e o norte, é outubro de 2004.

Desta forma, o Mercosul demonstra estar unido quando se trata de fazer frente a propostas comerciais do bloco europeu, enquanto a nível interno as disputas continuam ocupando as manchetes da imprensa brasileira e portenha.

A disputa das geladeiras - denominação carregada de humor dada pela imprensa à disputa sobre a entrada massiva de eletrodomésticos brasileiros na Argentina – neste mês de julho, levantou outra vez o velho problema interno do Mercosul sobre a tremenda disparidade entre as economias dos seus países membros. A indústria argentina não se desenvolveu como a brasileira nos últimos anos, somado ao fato de que o PIB argentino sofreu uma redução de 20% em cinco anos.

O próprio governo argentino reconheceu que não foi a competição brasileira a causadora desta assimetria econômica entre os dois países, mas a “irresponsável aplicação de um programa de liberalização sem instrumentos de regulação estatal” levado a cabo pela Argentina nos anos 90. Ao contrário, as exportações argentinas para o Brasil hoje em dia representam 250 mil postos de trabalho, quando no início do Mercosul em 1991 representavam apenas 80 mil.

A Argentina, durante anos, foi a melhor aluna na hora de aplicar as medidas neoliberais propostas pelo “Consenso de Washington”. E, naquela época em que buscava manter “relações carnais” com os EUA, reclamava do Brasil a adoção de medidas liberalizantes do mercado nacional. Passa a euforia privatizante, o país sofreu uma crise econômica brutal, com a desvalorização da moeda, seguida de uma crise política sem precedentes em dezembro de 2001, quando o país chegou a ter cinco presidentes em duas semanas.

De acordo com especialistas econômicos, o principal problema interno do Mercosul reside na assimetria econômica entre o Brasil e a Argentina. Entenda-se, tamanho da economia e capacidade de produção. Hoje, o PIB brasileiro é 3,3 vezes maior do que o argentino. Ademais, o PIB brasileiro significa mais de 77% do PIB do Mercosul e 50,68% do PIB de toda América do Sul, calculado em US$ 971,479 bilhões. Ou seja, somados os PIBs de todos os 11 países sul americanos, o resultado obtido é menor que o PIB brasileiro. Diante deste fato, parece inacreditável que somente em 1958 a indústria brasileira conseguiu ultrapassar a argentina.

Contudo, o projeto hegemônico brasileiro passa necessariamente pela ajuda externa aos vizinhos, primeiro aos países membros do Mercosul – Argentina, Uruguai e Paraguai, e posteriormente aos demais da América do Sul. Como acertadamente afirmou Renato Baumann, representante da CEPAL no Brasil, “uma hora o Brasil terá de discutir se o BNDES vai investir no Nordeste ou num país vizinho”. Essa será a grande encruzilhada brasileira no caminho para ocupar um papel mais ativo no teatro de operações mundial.

O acordo definitivo entre o Mercosul e a União Européia beneficia o Brasil tanto no plano de sua aspiração hegemônica no subcontinente americano, como no plano econômico, pois segundo cálculos da Confederação Nacional da Agricultura – CNA, o novo acordo comercial possibilita um crescimento de US$ 2,5 bilhões nas exportações brasileiras, somente no agronegócio.

Em ambos bloco os números são gigantescos: O Mercosul possui 220 milhões de habitantes e um PIB de US$ 570 bilhões, enquanto a União Européia possui 455 milhões de habitantes e um PIB de US$ 11,1 trilhões.
Juntos, a União Européia e o Mercosul serão a maior área de livre comércio do mundo, com 29 países, 675 milhões de habitantes e uma força econômica de US$ 11,6 trilhões.