quinta-feira, julho 07, 2005

Pânico em Londres


LONDON

Smoke
Lingers 'round your fingers
Train
Heave on - to Euston
Do you think you've made
The right decision this time?
You left
Your tired family grieving
And you think they're sad because you're leaving
But did you see the jealousy in the eyes
Of the ones who had to stay behind?
And do you think you've made
The right decision this time?

You left
Your girlfriend on the platform
With this really ragged notion that you'll return
But she knows
That when he goes
He really goes
And do you think you've made
The right decision this time?

The Smiths,
Morrissey e Johnny Marr,
no disco Rank, 1988.


Que Londres estava ameaçada já sabíamos, mas que os terroristas iriam atacar justamente durante a festa pela sua escolha para sediar a Olimpíada de 2012, isso ninguém podia prever. Inclusive o próprio governo Blair já tinha anunciado que “a pergunta não é se haverá um atentado terrorista em Londres, mas quando acontecerá”. Em apenas 24 horas, Londres passou da alegria ao pânico, no momento em que todas as atenções estavam no norte, em Gleneagles, a quase 70 km de Edimburgo, na Escócia, na reunião do G-8.

O mundo despertou nesta manhã de 7 de julho de 2005 com a terrível notícia dos ataques terroristas ao metrô de Londres. De acordo com informações da Scotland Yard, pelos menos quatro explosões abalaram a linha do metrô londrino, matando quarenta pessoas e ferindo outras setecentas. Um ônibus turístico (double decker bus) voou pelos ares no centro da cidade, perto de Tavistock Place e Russel Square.

As estações de Aldgate, Liverpool Street (no coração da City, o centro financeiro de Londres), King’s Cross (próxima da Biblioteca Britânica), Moorgate (a poucas quadras de Liverpool Stret), Edqware Road (perto do Regent’s Park), foram as mais atingidas. As estações de Saint Pancras e Stratford foram evacuadas sem qualquer explosão.

Às oito e quarenta e nove da manhã de hoje, hora de Londres, uma explosão abalou um trem que seguia entre as estações de Liverpool Street e Aldgate, no meio da city. Naquela hora se falava em problema elétrico ou choque de trens. Em seguida foram ouvidas duas outras explosões, na mesma linha Hammesrsmith & City: uma entre King’s Cross e Russel Square e outra na estação Edgware Road.

O jornal alemão Der Spiegel, na versão de Internet, publicou que uma web islâmica anunciava que o grupo Al Qaeda reivindicava a autoria dos atentados de Londres. No texto, o grupo terrorista Organização Secreta do Grupo da Al Qaeda para a Organização da Jihad na Europa afirmava: “Em nome de Deus, clemente e misericordioso. A paz e a bênção para seu Profeta (Maomé), o Sorridente e o Lutador. Alegre-se, nação do Islã; alegre-se nação dos árabes. Chegou o momento para nos vingarmos do Governo britânico, cruzado e sionista pelos massacres que a Grã-Bretanha comete no Iraque e no Afeganistão. Os heróis mujahedins realizamos bendito ataque em Londres, e agora a Grã-Bretanha está em chamas devido ao temor e ao susto no norte, no sul, no leste e no oeste (da cidade)”. No final do comunicado alertam a Dinamarca e a Itália, “e todos os Governos cruzados”, que receberão o mesmo “castigo”, caso não retirem suas tropas do Iraque e do Afeganistão.

O Primeiro-Ministro Tony Blair respondeu, sem a verve de Churchill, mas com uma vaga lembrança: “É importante que os terroristas percebam a nossa determinação em defender nossos valores e nosso modo de vida. Não conseguirão nunca destruir o que valoramos neste país. Matam a gente inocente somente para impor seu extremismo ao mundo. Nunca conseguirão o objetivo de destruir o que nós amamos”.

Londres confirma o destino já seguido por Nova York, em 11 de setembro de 2001, e por Madri, em 11 de março de 2004. Os efeitos imediatos dos atentados são espalhar o terror e a aumentar a distância entre o Ocidente e o Oriente. Exatamente o que desejam os extremistas de ambos os lados, os mesmos que socavaram o papel da ONU e pregam alucinadamente a existência de uma guerra de civilizações. O século XXI começa sob o signo do medo, vivemos a “era do medo total”, nas palavras de Herman Tertsch.

Eu me lembro de uma noite de sábado em Londres, quando ainda não vivíamos na “era do medo” e os druidas protegiam a “pérfida Albion” das armadas espanholas e dos bombardeiros nazistas. O pub não estava cheio e três jovens senhoras conversavam animadamente no balcão, bebericando seus espumantes copos de Guinness. Os dois jovens senhores entraram no pub com suas camisas havaianas vermelha e azul, que mal se escondiam debaixo de seus casacos de couro preto. Estavam com espíritos de “fiesta”, afinal, era noite de sábado. Puseram-se ao lado das jovens senhoras no balcão e já engataram uma conversa mole sobre a musica que se ouvia naquela noite cheia de magia.

Não sei o que se passou, mas quando me retirava pro hotel, todo o bar dançava ao redor daquele grupo impossível de dois baixinhos em camisas havaianas e três jovens senhoras de vestidos decotados. Tudo aconteceu em questão de minutos. Vesti minha jaqueta, enrolei o cachecol no pescoço, ajeitei minha “gorra” de aposentado espanhol e senti no rosto toda a frieza daquela noite londrina quando abri a porta do pub. Desci a rua mal iluminada calmamente. Caminhando em direção ao hotel, enquanto acendia o último cigarro da noite. Ainda se podia sonhar. E eu sonhei.

* Ver neste blog A Era do Medo - abril de 2004 - e A insegurança do mundo - setembro de 2004