segunda-feira, agosto 09, 2010

Tony Judt, historiador especialista em Europa do século XX


Tony Judt, historiador especialista em Europa do século XX

'Posguerra', finalista do Pulitzer, é uma análise monumental do continente desde a II Guerra Mundial

DAVID ALANDETE – El País - 09/08/2010

Tradução de Antonio de Freitas

Tony Judt, um dos historiadores e pesquisadores da Europa do final do século XX mais respeitados em sua profissão, faleceu na sexta-feira (06/08/2010) em sua residência de Nova York, segundo confirmou a Universidade de Nova York, para a qual trabalhava como professor. Tinha 62 anos e havia padecido, durante quase dois anos, dos devastadores efeitos da doença de Lou Gehrig, ou esclerose lateral amiotrófica.

Judt nasceu no seio de uma família judia do Reino Unido em 1948. Em sua juventude viveu num kibutz em Israel. A experiência na fazenda coletiva constituiu uma etapa importante de sua formação e lhe marcou como sionista de esquerda durante alguns anos. Chegou a servir como motorista voluntario na Guerra dos Seis Dias, que enfrentou Israel contra a coalizão de países árabes em 1967.

Aquele fervor sionista de juventude, contudo, não durou muito. Prontamente mudou seu esquerdismo com toques radicais por uma postura mais social-democrata. E, em seus textos, criticou não apenas o poder e a proeminência internacional dos Estados Unidos, mas também o peso das instituições judias dentro da arquitetura política norte-americana.

Sua obra mais famosa, publicada em 2005, é ‘Posguerra: Uma historia da Europa desde 1945’, uma crônica monumental do continente nos anos posteriores à II Guerra Mundial. Em sua análise, Judt afirma que a cooperação dos países europeus nos 30 anos posteriores à queda de Adolf Hitler demonstra que o pacifismo e o multilateralismo podem gerar uma estabilidade e uma prosperidade duradouras. Com ‘Posguerra’ ficou finalista ao Prêmio Pulitzer em 2006.

"América terá o maior Exército e a China criará mais produtos, e mais baratos", escreve na conclusão do livro. "Porém, nem a América nem a China dispõem de um modelo útil que sirva universalmente. Apesar dos horrores de seu passado recente - e em grande parte, graças a eles-, eram os europeus os que agora estavam genuinamente posicionados para oferecer ao mundo algum modesto conselho sobre como evitar repetir os erros do passado. Poucos haveriam dito há 60 anos, mas pode ser que o século XXI ainda pertença aos europeus".

Era professor da Universidade de Nova York desde 1987. Nessa instituição ajudou a fundar o Instituto Remarque, onde pesquisava e ensinava historia recente de Europa. Judt conta com nove livros, sobretudo respeitadas análises nesse campo. Ademais, colaborava com a revista New York Review of Books, na que consagrou sua mudança de ideas sobre o conflito árabe-israelense.

Num texto polêmico de 2003, proclamou que Israel era um "anacronismo" e pediu a criação de um Estado binacional para árabes e judeus. Um de seus últimos artigos defendia que as críticas aos atos de força do Executivo de Israel não estão motivadas pelo antissemitismo e que o abuso deste qualificativo era perigoso para a memória do Holocausto.

No outono de 2008 foi-lhe diagnosticado esclerose lateral amiotrófica (ELA), que provoca uma progressiva paralisação dos músculos. Trata-se da mesma doença degenerativa que padece o cientista Stephen Hawking. Judt estava paralisado de pescoço para baixo. Custava-lhe tragar, falar, inclusive sustentar a mandíbula. Necessitava ajuda para praticamente tudo.

Ao longo de seus últimos meses, escreveu sobre sua doença e sobre suas impressões da vida, o que representou um giro na sua carreira e a inauguração de uma nova etapa de reflexão muito mais pessoal. Em questão de meses, Tony Judt se converteu em tetraplégico, necessitando de um tubo de oxigênio para respirar. Sua mente, porém, estava intacta, e seguiu produzindo suas lúcidas análises sem qualquer tipo de interrupção, até seu último dia de vida.