A
livraria dos meus sonhos
Antônio de Freitas
Publicada
anteriormente em 02/01/2006
Sempre
que a vida prega alguma peça e me vejo meio assustado, com medo do futuro,
penso em minha livraria. Sim, eu tenho uma livraria. Uma livraria que carrego
dentro de mim, talvez minha loucura definitiva, como diria minha mãe, um sonho
de abrir uma livraria numa imensa terra de analfabetos.
Mas minha
livraria, como todo sonho, é feita de livros e momentos, de pessoas e
sentimentos, de poesias e contos, de cafés e conhaques, de alegrias e de
algumas lágrimas. Ela vive dentro de mim e sempre que me sinto triste,
retiro-me à minha livraria e sinto o odor de madeira e papel que vem de suas
estantes. Vejo o belo sofá branco convidando os visitantes ao conforto de seu colo
e a cafeteira fumegante a espalhar no ar o cheiro forte e quente de café,
aliado incondicional de um cigarro.
As livrarias resistem, apesar de este ano, meu bom amigo Gaspar haver fechado
sua “Punto y Coma”, uma das melhores livrarias da Espanha. Passei infinitas
horas a ‘buquinar’ naquela livraria e a conversar com Gaspar. Aprendi muito
naquelas tardes de solidão e melancolia durante a tese em que eu buscava
refugio entre as estantes de madeira e o cheiro de papel novo da “Punto y
Coma”. Recordo da eterna promessa de Gaspar, jamais cumprida, de levar-me a
Denia para comermos um arroz negro. Lembro sua jocosa proposta de deixar a
livraria aberta durante a noite, para que eu pudesse entrar sorrateiramente a
surrupiar meus livros favoritos, tudo para criar a inacreditável manchete dos
jornais da manhã seguinte: Livraria assaltada. Tudo isso pra demonstrar sua
teoria de que ninguém rouba uma livraria, pelo menos seus livros.
E existem as livrarias irreais, as verdadeiras e mágicas livrarias, como aquela
que entrei no Quartier Latin, em
Paris. Era uma velha livraria, daquelas que vendem mais livros velhos que
novos. E possuía um dono de cabeleira branca e suspensórios, a ler o jornal com
uma enorme lente de aumento. Aquele lugar, com seu ambiente noir, parecia saído do passado. Quando
regressei a Espanha, ainda era verão e fui pro meu balcão favorito, o do Café
das Letras. Para minha surpresa, Dani, o proprietário, havia pedido duas cópias
de um cartaz de um concurso fotográfico promovido pela Universidade de Salamanca,
ilustrado exatamente pelo retrato da minha livraria francesa!!! O nome da foto
era “O Livreiro Egípcio”. Mas eu insisto, até hoje, que aquela livraria está em
Paris.
Muitas
outras livrarias passaram por minha vida, como a Leonel Franca, naquela
Teresina do começo dos anos 80, a Livro 7, no Recife do meu início de curso de
Direito, e a livraria da Moema, que acho que se chamava Papirus, em São Luís.
Todas tiveram seu momento mágico e hipnotizaram aquele menino que um dia queria
capturar toda a cultura.
Hoje, os grandes centros comerciais estão matando as livrarias, com seus “best
sellers” vendidos em estantes aos quilos, como qualquer produto de limpeza,
cheios de descontos promocionais. Tudo pra quebrar a livraria, a verdadeira
livraria, aquela onde os atendentes são alfabetizados e conseguem até dá uma
opinião razoável sobre a obra que despertou teu interesse.
Eu, por minha vez, frequento hoje em dia duas livrarias enormes: a Livraria Cultura e a Fnac, ambas em Brasília. Passo horas naqueles lugares sagrados, principalmente em minhas tardes de domingos, mas.... não compro nada. E não o faço pela simples razão de que eles, por serem grandes livrarias, não precisam de minhas moedas para sobreviver. De maneira que eu desfruto de minha visita, analiso os lançamentos, rememoro as velhas edições, namoro as obras clássicas e não compro absolutamente nada. Devo ser o desgosto de todas as atendentes. Prefiro ir a uma pequena livraria café chamada Rayuela, na 413, que significa “Jogo da Amarelinha” em português, como no titulo da imortal obra de Julio Cortaza, para tranquilamente comprar-me algo.
Eu, por minha vez, frequento hoje em dia duas livrarias enormes: a Livraria Cultura e a Fnac, ambas em Brasília. Passo horas naqueles lugares sagrados, principalmente em minhas tardes de domingos, mas.... não compro nada. E não o faço pela simples razão de que eles, por serem grandes livrarias, não precisam de minhas moedas para sobreviver. De maneira que eu desfruto de minha visita, analiso os lançamentos, rememoro as velhas edições, namoro as obras clássicas e não compro absolutamente nada. Devo ser o desgosto de todas as atendentes. Prefiro ir a uma pequena livraria café chamada Rayuela, na 413, que significa “Jogo da Amarelinha” em português, como no titulo da imortal obra de Julio Cortaza, para tranquilamente comprar-me algo.
Então, como agora, enquanto todos estão sorrindo e festejando o Ano Novo, eu
caminho lentamente para a livraria dos meus sonhos, a livraria que carrego
dentro de mim. Elejo algo que me dará um imenso prazer de ler, sento na
poltrona de couro marrom, minha caneca de café a mão, um Parliament aceso no
cinzeiro. Começo a leitura entre aromas de velhas prateleiras e papel. Papel
vivo, cheio de estórias, sabedoria, informação, diversão e companhia. Papel
cheio de vida.