terça-feira, janeiro 25, 2005

George Bush, segundo tempo


Liberdade. Esta foi a palavra mais ouvida no discurso de posse do Presidente dos EUA George Walker Bush, dia 20 de janeiro de 2005, no que será seu segundo mandato. A palavra liberdade ecoou quarenta e duas vezes nas escadarias do Capitólio, em Washington DC, nos equivalentes em inglês “freedom” e “liberty”.

O segundo mandato dos Presidentes dos EUA costuma carregar em si uma “maldição”, normalmente é um escândalo que enlameia a reputação do ocupante da Casa Branca. Bill Clinton sofreu o escândalo Mônica Lewinsky, Ronald Reagan padeceu com o caso Irã-contras da Nicarágua. Eisenhower teve no seu segundo mandato a escalada da guerra fria, além de ter que aceitar a renuncia de seu chefe de gabinete acusado de aceitar presentes de executivos. Woodrow Wilson sofreu um derrame e terminou seu segundo mandato inválido. Pior mesmo foi Abraham Lincoln, que foi assassinado cinco semanas após tomar posse no segundo mandato. O próprio George Washington teve que enviar tropas para sufocar uma revolta na Pensilvânia, depois que taxou o uísque. Desta maneira, é provável que a maldição do segundo mandato venha a assombrar a Bush, principalmente se não conseguir unir aos EUA, que seguem divididos ao meio, como comprovou os números da última eleição presidencial.

O 43º Presidente dos EUA venceu as eleições americanas de novembro de 2004 com 51% dos votos, ou seja, o senhor Bush obteve 59.017.382 votos contra 55.435.808 votos dados ao candidato democrata, o senador John Kerry, equivalente a 48% do escrutínio. Esta votação resultou em 274 votos no colégio eleitoral para o Presidente Bush, enquanto que o senador Kerry logrou apenas 252.

Os problemas que esperam pelo senhor Bush neste segundo mandato são vários, sendo o maior deles a estabilização da situação no Iraque. A segurança nacional continua a ser um tema de obsessão nos EUA, principalmente depois do 11 de setembro, sendo que no primeiro mandato houve a aprovação de leis que cerceiam as liberdades civis dos estadunidenses e a adoção de uma política exterior militarista, que aumentou o déficit do governo, e intervencionista, primando pelo principio do “ataque preventivo”. No campo das relações internacionais, os EUA necessitam recuperar o aliado europeu e partir para o multilateralismo, recuperando a credibilidade da ONU. Bush, neste mandato, nomeará a mais de nove juizes da Suprema Corte, que decidirão sobre temas polêmicos como aborto, pena de morte e direitos civis. Com relação à Constituição dos EUA, Bush prometeu na campanha a aprovação de uma emenda que encerraria, definitivamente, qualquer legalização dos matrimônios entre pessoas do mesmo sexo. Bush restringiu, em agosto de 2001, o uso e fundos públicos para a pesquisa com células tronco, fundamentais na busca da cura do Alzheimer e da diabetes. O sistema de saúde continuará sem atender as classes menos favorecidas dos EUA, apesar da promessa de campanha de baratear o preço dos remédios. Por fim, Bush continuará a negar-se a assinar o Protocolo de Kyoto, acordo internacional para a redução das emissões de gases contaminantes da atmosfera, como havia prometido o Presidente Bill Clinton, antes de deixar a Casa Branca.

Uma pesquisa realizada pela BBC em vinte e dois países de quatro continentes - e divulgada horas antes da posse - aponta para o fato de que seis pessoas de cada grupo de dez entrevistados consideram a reeleição do senhor Bush como algo negativo para a paz e a segurança mundial. Ademais, os entrevistados consideram “pior” a sociedade estadunidense depois da vitória do senhor Bush e 66% dos entrevistados desaprovam a presença militar no Iraque. Por fim, a imagem mais positiva do senhor Bush vamos encontrá-la na Ásia, e a mais negativa na América Latina e no Canadá. Por países, a pior imagem de Bush se encontra na Turquia, seguida da Argentina, Brasil, Alemanha e França. Convém relembrar a distinção existente entre o governo dos EUA e seus cidadãos, o que nos leva a crer na inexistência de antipatia aos estadunidenses, de um modo geral, neste sentimento para com o senhor Bush.

Costumam dizer que não se pode entender a política nos EUA sem entender a doutrina calvinista. Como afirmou Arthur Ituassu, em artigo recente, “fadado ao pecado, o Homem calvinista é vigiado de perto por uma divindade impiedosa e onipresente”. Caberá a nós, o resto do mundo, o papel de Homem calvinista? E quem nos vigiará de maneira onipresente e impiedosa?

No seu discurso de posse desta semana, o senhor Bush usou a palavra “liberdade” quarenta e duas vezes. Entretanto, a palavra “democracia” somente foi escutada uma única vez. Nada mais.