segunda-feira, agosto 01, 2005

Eu que admiro loucos


O acaso vai me proteger
Enquanto eu andar distraído

Epitáfio,
Composição de João Ubaldo Viera
Gravada pelos Titãs.


Por que sempre ficar do lado “errado”? E tomar as posições mais “ridículas”? Apoiar os palestinos contra o Estado de Israel. Torcer pelos judeus contra o Estado Nazista. Apoiar os alemães orientais contra o estado Soviético. Apoiar Cuba contra os EUA e torcer pelo povo cubano contra a ditadura comunista. Sempre apoiando Davi contra Golias, sem que este, necessariamente, tenha que ganhar, sempre defendendo os perdedores. Mas somente enquanto durar a inferioridade, afinal, por trás de todo complexo de inferioridade há um de superioridade. Eu sei de todas as minhas palavras chocantes.

Para mim, Zinho é maior que todo o Centro Acadêmico eleito e os “pombas” da vida. E as palavras nunca ditas representam mais que todas as besteiras já faladas em noite de bebedeiras e “tonterias”. As ofensas, as pequenas invejas e o terrível desprezo pela pessoa humana é que me tiram do sério. É a mentira, os sentimentos mesquinhos, a falta de grandeza, de atitudes nobres, a mediocridade de falar somente sua própria língua, o comodismo protocolar e, principalmente, a falta de um coração nobre, faz com que eu tenha um tremendo desgosto por essas pessoas.

A covardia, o não correr com a bandeira nas mãos no meio da passeata, o medo da opinião dos outros, o não cantar a canção proibida bem alto, o “babão-de-interior” profissional, o homem-merda que tem medo de ser diferente dos demais, o idiota que nunca tem dúvidas, nunca se pergunta o porquê das coisas, a pessoa “normal”, aquela que tem medo do novo, da aventura, o camarada que somente sabe viver no seu mundinho cor-de-rosa que rotula todos os demais é que me enoja. Quiçá nunca se cheguem muito perto de mim, tais coisas ou pessoas.

É porque admiro os loucos, aqueles que vestem a camisa pelo avesso e no meio da festa começam a gritar palavras desconexas, aqueles que depois de muitos anos casados e vivendo sem paixão, dizem adeus às conveniências e arriscam tudo em começar de novo, aqueles que vivem a vida de verdade e sugam dela tudo o que podem sugar, com todas as suas forças.

Admiro aqueles que, independentemente do que dirão o filhos criados sem pai, vivem, vivem e com um sorriso na cara dizem não para o mundo e sim para a vida e sabem compreender a beleza das coisas simples.

Aquele que toma todas e fala as maiores barbaridades, depois pede desculpas e desmaia no meio do casamento idiota, para mim é divino. Sou muito assim. É correr o Iate Clube inteiro com dois de teus melhores amigos atrás só porque deu vontade. Ou no meio da festa na casa do melhor amigo de teu pai, botar o pau pra fora para a sobrinha órfã dele te tocar, com a maior cara de pau, e todo mundo te encontra. E, passar a mão no rabo do irmão do amigo do colégio somente por brincadeira e o cara dar o maior vexame, parecendo até que alguém duvidava que ele não tinha curtido. Aqueles que tem as respostas mais tolas para as perguntas mais óbvias, aqueles que simplesmente não estão nem aí para esta cambada de “mamones” maduros, quase prontos para cair na lama.

São cenas “ridículas” e que pra mim são pura lembrança, como eleger todos os anos as piores frases ditas como as melhores do ano. Ou o Conselho de Compadres, instituído como órgão supremo da turma. E depois da merda feita, se esconder na casa da Ana e do James pra fugir do olhar triste dos pais.

É ser demasiado Oswaldiano, é perder o amigo e não perder a piada. É buscar o inalienável direito a sorrir de si mesmo, como condição primeira para sorrir dos outros. É ser tremendamente Borginiano e não se levar, em qualquer hipótese, a sério. É a eterna busca da noite que nunca acaba, se recusar a envelhecer e se tornar sério e aborrecido. É pôr a gravata mais risível na audiência mais séria, para não falar da cueca do Piu-piu por debaixo do terno bacharel de anel e capelo.

Ou dizer na posse do Desembargador para ele fazer como disse Pink Floyd, “shine on crazy diamond” e no outro dia ele perguntar o nome do filósofo citado. É morrer de rir dos casais que acreditam no amor e na fidelidade eterna e chegar na reunião dos antigos alunos com tua namorada negra e linda, só para olhar a cara dos católicos de plantão.

Torço pela felicidade irrestrita daqueles que a cada dia querem aprender algo novo e nunca se cansam da aventura de viver, daquele tipo de gente que você é capaz de se lembrar que chora baixinho e dá gargalhada no meio da hipócrita sociedade, tirando o maior sarro da cara dos outros. Sou profundamente apaixonado pelas pessoas que vêem os sonhos como algo realizável, que tentam melhorar o mundo e se entregam por inteiro a emoções verdadeiras.

Detesto, do fundo do meu ser, as pessoas que não conseguem sorrir dos títulos acadêmicos e das faculdades de Direito, com seus professores incapazes de distinguir competência de tristeza, de falta de alegria, bem como os filhos de mães batalhadoras e feias, cheios de frases feitas e incapacidade para reconhecerem o belo da vida. Detesto as viúvas virgens e todas as pessoas que não compreendem que sem sexo bom e fácil a vida não pode existir , sadia e feliz. Não consigo suportar as pessoas que não “são loucas depois de todos estes anos”, como disse Paul Simon.

Bato palmas pro velho Professor Adélman que ao ser convidado para ministrar a aula da saudade de uma certa turma de formandos disse que isso era “coisa de viado”, e de tal produto o departamento tava cheio. Ninguém teve coragem de falar algo parecido antes dele. É ser totalmente Borginiano! Ou, como o pseudo intelectual de província que ao fazer uma pergunta ao pseudo intelectual da metrópole recebe como resposta um “tá louco ou não leu nada?” Ridículo.

Então o que estamos esperando? Se todos os velhos já disseram que se pudessem voltar no tempo arriscariam mais, seriam mais felizes, viveriam de verdade e não apenas sobreviveriam, só nos resta irmos para a vida, eternamente “ridículos”.

* Escrito na cidade de Valencia, Espanha, em junho (primavera) de 1999.