quarta-feira, janeiro 24, 2007

Canção triste de espera














O mundo é um ótimo lugar pra nascer
se não te importa que a felicidadenem sempre tenha muita graçase não te importa um quê de infernode quando em quandojusto quando tudo vai bempois nem mesmo nos céusse canta o tempo todo.

Lawrence Ferlinghetti,
em "O mundo é um ótimo lugar...",publicado originariamente em "Pictures of the Gone World",em 1955,e no Brasil publicado em "Vida sem fim", 1984.

A canção triste de espera começa a soar no meu ouvido, justo agora, no meu melhor momento, suas palavras de tristeza soam como um pesado sino de desolação no meu coração cheio de nós.

E lembro de nós, sorrindo pela cidade que nos esquecia, entre beijos e carinhos, no meio da nossa adolescência, no meio de nossas vidas. Como pude esquecer, durante todos esses anos, da nossa alegria?

A canção triste de espera arranca seus acordes nesta tarde quente e chuvosa na cidade que comprime minh’alma de doce angústia e lembranças de solitárias caminhadas por praças vazias, depois daquelas manhãs no colégio dos padres.

A canção triste de espera invade-me como uma avalancha de mau gosto de boca e pesar escuro, fecha meu tempo, derrapa meu sol pro Oriente, subtrai-me de meus melhores sonhos de felicidade a dois, anoitece com o vento mais frio minha carne e queima meu estomago com a acidez das más noticias.

A canção triste de espera atropela minha alegria. E nunca esquecerei que na minha melhor hora, no meu melhor momento, soou a triste canção da espera.

* Escrito na cidade de Teresina, em 24 de julho de 2006.

segunda-feira, janeiro 15, 2007

Carta a um amigo distante


infante, desejavas crescer
para realizares os teus sonhos de conquista.
adulto, queres retornar ao país de tua infância.
não sabes o que queres.
queres apenas morrer, esquecer.
queres viver eternamente num mundo
que não é o teu. contudo, tens esperança
e agora teces um poema sem fim
com o novelo infinito de tua vida
que se desdobra do nada ao tudo...

Elmar Carvalho,
em "Vida in Vitro",
no livro “Lira dos Cinqüentanos”,
2006.


Estimado amigo Elmar, não sabes minha alegria ao receber tua carta, acompanhada do teu poema “Vida in Vitro”. Sim, Elmar, eu compreendo perfeitamente tudo que nele está escrito. Entendo tuas lembranças da infância, da busca da menina de uma noite de verão (ou inverno). E, principalmente, entendo quando escreves:

“no entanto
ainda não estás saciado,
esperas um milagre
mas não sabes se os milagres ainda existem,
estás perdido”


Sim, poeta, tantas vezes me senti assim, tal qual teu poema. Em busca de um milagre, de alguma que dure mais que um flerte. Quantas vezes não consigo dormir e vago com meus pensamentos e lembranças. Quantas vezes busco respostas para as perguntas que desconheço. E ando pelas ruas, cumprimento os amigos, olho as pessoas e não me vejo. Sempre buscando encontrar o local secreto combinado que esqueci, a palavra mágica, a menina que dançou comigo à beira da piscina na festa desconhecida e iluminada de lua...

Há algo, não sei explicitar, que lembra a poesia “beat” americana e um Drummond insone. Talvez seja a eterna busca da “noite que nunca acaba”, do copo que nunca seque, da mulher que nunca te abandone, do amigo que nunca traia a amizade, não sei. Mas alguma coisa em mim entende perfeitamente tua poesia. Quiçá seja os ecos de nossas conversas na velha Sunab, pois lembro termos falado sobre alguns sentimentos revelados na poesia.

A vida por aqui é uma descoberta diária. A Espanha de hoje na lembra Cervantes, mas brilha nas páginas de um Antonio Muñoz Molina. Entretanto, carrego o Brasil na alma. As lembranças de Teresina, do Piauí, nosso pobre Estado sem nenhuma sorte, do nosso país, me comovem. As comparações com o velho mundo são inevitáveis. Por que esta eterna incompetência para construir um grande país? Por que tanta corrupção, miséria, fome, indiferença e egoísmo?

Por que tanta falta de humildade, tanta falta de respeito pelo ser humano, tanta falta de vergonha na cara? Será este o legado que deixaremos aos nossos netos? Será este o Brasil que queremos para nós mesmos? Se todos cumprissem seu dever, se todos participassem com sua pequenina quota (não é necessário muito), tudo seria tão diferente.

A Universidade de Valencia, onde estudo, semana passada completou quinhentos anos. Isto mesmo, quinhentos anos de existência como universidade. E não é a mais antiga da Espanha, pois Salamanca é do século XIII.

Aproveitando a semana de festividades pelo aniversário da universidade, viajei à Portugal, cruzei o Algarves e o Alentejo de carro e fui até Lisboa. Você não imagina o quanto Portugal é pobre e bonito.

As palavras acabam e fica o convite para você cruzar o Atlântico e conhecer um pouco desta parte do mundo, onde com certeza encontrará uma casa acolhedora, um copo de vinho e um amigo que sempre gostou de conversar com você, pois sempre aprendeu muito com as sua lições.

Saudações à sua família e aos nossos amigos.

PS: Agora entendo porque o Oswald descobriu o Brasil desde Paris. É porque daqui se pensa demasiado em casa.


* Escrito na cidade de Valencia, Espanha, na primavera de 1999.

segunda-feira, janeiro 01, 2007

A fadiga da expansão européia




Não podemos ampliar
a União Européia eternamente
sem reformar as instituições".

Jose Manuel Durão Barroso,

Presidente da Comissão Européia,
em setembro de 2007.


Hoje, dia primeiro de janeiro de dois mil e sete, a União Européia - UE atinge a marca de 27 países, em sua sexta ampliação, com a entrada dos dois Estados mais pobres do clube europeu: Romênia e Bulgária - que juntos representam menos de 1% do PIB do bloco. Desde 2004, ambos fazem parte da OTAN.

De entrada, os fundos de coesão da UE injetarão até 2013, ao redor de 32 bilhões de euros (mais de R$ 90 bilhões) na Romênia e 11 bilhões de euros (R$ 31 bilhões) na Bulgária, para programas de fortalecimento das instituições públicas, de implantação da legislação européia e infra-estrutura. Por outro lado, a União Européia ganha influência sobre a região dos Bálcãs e de acesso ao Mar Negro, e suas importantes fontes de energia.

Bulgária é um dos territórios habitados mais antigos da Europa, desde o século II, e esteve sob o domínio do império otomano por cinco séculos, até sua independência em 1878. República Popular e satélite da URSS de 1946 até 1989, Bulgária teve a mais pacífica transição para o capitalismo, com eleições presidenciais em 1990 e uma nova Constituição em 1991. O padrão de vida de seus habitantes caiu 40% com relação aos tempos do comunismo, à causa da inflação, do desemprego e da corrupção generalizada. Desde 1994 a economia búlgara começou a recuperar-se e atualmente cresce a uma taxa de 5% ao ano. Utiliza oficialmente o alfabeto cirílico e 85% de sua população é cristã ortodoxa.

Romênia foi quase propriedade particular do ditador Nicolae Ceausescu durante mais de vinte anos. Tentando exercer uma política externa independente da URSS, Romênia foi o único país membro do Pacto de Varsóvia a condenar a invasão da Tchecoslováquia em 1968, o que lhe rendeu bilionários empréstimos pelos países ocidentais. Ceausescu foi executado em dezembro de 1989, quando uma insurreição popular deu um basta ao regime, promovendo as reformas democráticas. De sua população, 87% são cristãos ortodoxos.

A “fadiga de expansão” da União Européia não contagiou os novos sócios, pois suas populações acreditam na sua maioria, numa melhoria de seus padrões com a entrada no bloco europeu, apesar de que alguns países que entraram no clube europeu em 2004 terem sofrido crises pontuais após seus ingressos. A “fadiga de expansão” sentida na União Européia resume-se no fato de que menos da metade sua população acredita que o bloco esteja progredindo no caminho certo com sua expansão política.

Contudo, na matéria “imigração” a recepção não foi das melhores, porto que apenas a Suécia e a Finlândia não imporão restrições aos búlgaros e romenos. Todos os demais 15 sócios iniciais da União Européia (Bélgica, França, Alemanha, Itália, Luxemburgo, Holanda, Dinamarca, Irlanda, Reino Unido, Grécia, Portugal, Espanha, Áustria, Finlândia e Suécia) fecharam as portas do mercado de trabalho aos novos sócios até sete anos, utilizando de normas do próprio bloco.

A entrada de Bulgária e Romênia encerra um novo ciclo do processo de integração europeu, que resultará numa prolongada pausa na esperada entrada de Turquia, Croácia e Macedônia no bloco.

O bloco europeu inicia-se em 1957, com o ingresso de Bélgica, França, Alemanha, Itália, Luxemburgo e Holanda. A primeira expansão dá-se em 1973, com a entrada de Dinamarca, Irlanda e Reino Unido. Em 1981, Grécia é aceita no grupo. Portugal e Espanha entram juntos em 1986. Áustria, Finlândia e Suécia entram no clube em 1995, encerrando um ciclo. A última grande expansão foi em 2004, com a entrada de Chipre, República Checa, Estônia, Hungria, Letônia, Lituânia, Malta, Polônia, Eslováquia e Eslovênia. Por fim, em 2007, Bulgária e Romênia entraram na União Européia que atinge seus 27 membros.

Hoje, ainda, inicia a presidência da Alemanha na União Européia, que durará até 30 de junho de 2007 - quando assumirá a presidência Portugal, que promete retomar as negociações para a implantação da Constituição Européia. A crise da Constituição Européia começou quando em 2005, França e Holanda a reprovaram em seus plebiscitos, em oposição à metade dos membros do bloco que a tinham aprovado.

Por fim, hoje marca a entrada da Eslovênia, ex-república da antiga Iugoslávia, como 13º país do bloco europeu a adotar o Euro como moeda nacional, dois anos e meio depois de sua entrada na EU e dezesseis anos após abandonar a federação socialista da Iugoslávia. Assim, atualmente fazem parte da zona euro Bélgica, França, Alemanha, Itália, Luxemburgo, Holanda, Irlanda, Grécia, Portugal, Espanha, Áustria, Finlândia e Eslovênia.

O Euro foi estabelecido pelo Tratado de Maastricht, em 1992, a nova moeda foi lançada como “moeda não-física” em 1999 e passou a tomar a forma de cédulas e moedas em 2002. Para participar da zona euro os países precisam cumprir uma série de critérios econômicos, como por exemplo, definir o tamanho da dívida pública, o grau de estabilidade da moeda e as taxas de inflação e de juros. A rigidez de exigências para entrar na zona euro se comprova no caso da Lituânia, que por ter sua inflação 0,1% acima da meta prevista, precisou adiar a adoção da moeda européia para 2009. Ou como Polônia e Hungria, que por seus déficits orçamentários elevados ainda não puderam adotar o Euro.