segunda-feira, maio 08, 2006

O petróleo é deles


Para a consecução de seus objetivos,
todos os povos podem dispor livremente
de suas riquezas e de seus recursos naturais,
sem prejuízo das obrigações decorrentes
da cooperação econômica internacional,
baseada no princípio do proveito mútuo
e do Direito Internacional.
Em caso algum poderá um povo
ser privado de seus próprios meios de subsistência.

Item 2, do Art. 1º,
do Pacto Internacional sobre
Direitos Civis e Políticos (1966)
e do Pacto Internacional dos
Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais (1966),
ambos assinados
pelo Brasil e pela Bolívia.


A festa do 1º Maio deste ano teve um sabor amargo para a Petrobrás. Apesar de todos os afagos feitos a Evo Morales, Presidente da Bolívia, a Petrobrás sofreu, até agora, uma verdadeira expropriação de seus investimentos de mais de US$ 1 bilhão naquele país.

Pelo ‘Decreto Supremo nº 28.701’, apelidado de “Heroes del Chaco”, de 1º de maio de 2006, o Estado boliviano, através de sua “Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos – YPFB”, recuperou a propriedade e o controle “total e absoluto” sobre a produção, transporte, refino, armazenagem, distribuição, comercialização e industrialização de seus hidrocarbonetos, cabendo a todas as companhias petroleiras estrangeiras adaptarem-se às novas regras de exploração e comercialização dentro de 180 dias. O Decreto foi seguido da ocupação militar dos campos petrolíferos e das refinarias estrangeiras naquele país, comandada pelo próprio Evo Morales.

Não é a primeira vez que a Bolívia nacionaliza seus hidrocarbonetos, mas a terceira. Na verdade, a Bolívia foi o primeiro país Latino-americano a proceder assim, quando em 1937 nacionalizou a Standar Oil Co. e em 1969 a Gulf Oil, ambas estadunidenses.

A noticia pegou de surpresa o governo brasileiro, notadamente o ministro das Minas e Energia, Silas Rondeau, o ministro interino das Relações Exteriores, Samuel Pinheiro Guimarães e ao presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli. O aumento para 82% dos impostos bolivianos sobre a produção da Petrobrás torna antieconômica a permanência da empresa na Bolívia.

A expropriação boliviana abre uma enorme crise política entre o Brasil e o país mais pobre da América do Sul, pois até a presente data ainda não se sabe se o governo boliviano irá ou não indenizar as empresas estrangeiras e de que forma, uma vez que o país não dispõe de reservas monetárias para tanto.

Apesar de louvável a atitude do governo socialista boliviano, do ponto de vista estritamente do povo boliviano reter os benefícios de suas riquezas naturais, não se deve esquecer que o país necessita de investimentos estrangeiros para sua exploração. Destarte, caso a Petrobrás se retire do território boliviano, seria substituída por investimentos oriundos da Venezuela e da China.

Contudo, a credibilidade das garantias jurídicas bolivianas foi abalada com a nacionalização dos hidrocarbonetos. Com certeza o mercado, esse grande destruidor de mitos no século XXI, reagirá ao ato nacionalista boliviano e as conseqüências serão imprevisíveis. Afinal, nenhum grande líder nacional deseja tornar seu país um pária a nível internacional.

Que o povo boliviano deve ser o verdadeiro beneficiário de suas riquezas naturais é uma verdade inabalável e ninguém será louco de defender o contrário. Contudo, os investimentos estrangeiros são importantes para esse beneficio, principalmente quando participam do desenvolvimento do país, pagando preços justos pelo gás e petróleo explorados.

Merece destaque, ainda, o fato de que o decreto expropriador boliviano haver sido assinado no momento em que o Presidente Evo Morales retornava de uma visita a Havana, onde criou junto a Fidel Castro e Hugo Chávez o “Tratado de Comercio dos Povos”. Ademais, Bolivia somou-se à “Alternativa Bolivariana para as Américas – ALBA, que Castro e Chávez lançaram em dezembro de 2004, que ainda não disse a que veio.

Atualmente, América Latina vive dias de tensão: o Mercosul patina, enquanto o Uruguai afirma que irá abandonar o bloco; Hugo Chávez ao criticar a assinatura de um acordo bilateral entre o Peru e os EUA, em detrimento da Comunidade Andina de Nações – CAN, detonou uma crise diplomática entre a Venezuela e o Peru; enquanto vários países assinam acordos bilaterais com os EUA.

Por fim, uma frase dos “Considerandos” do Decreto boliviano cabe destaque, ainda, por vincular a recuperação das riquezas naturais daquele país à luta dos movimentos sociais e dos “povos originários”, como base da recuperação da própria soberania nacional.