O crepúsculo dos Kirchner
Os argentinos temem que o governo não seja capaz de dirigir o país após perder as eleições legislativas
SOLEDAD GALLEGO-DÍAZ – El País - Buenos Aires - 13/07/2009
Tradução Antonio de Freitas Jr.
Tradução Antonio de Freitas Jr.
Se existe algo que os argentinos temem é a "desgobernación", uma palavra que traz a lembrança dos piores momentos de 2001, quando governos incapazes de fazer frente à crise abandonavam sua tarefa, sem cumprir seus mandatos. Essa palavra volta a ser protagonista, com uma diferença. Agora a oposição quer apoiar o governo de Cristina Fernández de Kirchner, debilitado pela perda das eleições legislativas de junho, para garantir que o mesmo chegará a 2011. A questão é que exige em troca que este limite seus poderes e reforme seu programa econômico. Em definitiva, que Néstor Kirchner perda protagonismo e deixe que um grupo de peronistas conciliadores controle o resto do mandato presidencial.
O resultado eleitoral aumentou a preocupação diante da possibilidade de que se precipite uma crise política num país que segue padecendo uma profunda crise social (40% da população em níveis de pobreza, segundo denunciou ontem a Igreja) e uma difícil situação econômica. No final de agosto o Congresso decidirá se anula ou não o decreto que concedeu "superpoderes" aos Kirchner e começará a discutir um novo orçamento, no qual a oposição, majoritariamente de direita, exige mudanças radicais.
"Os argentinos querem ver a seus dirigentes políticos sentados numa mesa falando", assegura Francisco de Narváez, peronista crítico e um dos ganhadores de junho. "O país está desgovernado, mas isso não quer dizer que o governo da presidenta esteja terminado. Deve terminar seu mandato. Porém tem que atuar de outra forma. Não se pode esperar por 2011 para levar a cabo um ajuste econômico sério".
O resultado eleitoral aumentou a preocupação diante da possibilidade de que se precipite uma crise política num país que segue padecendo uma profunda crise social (40% da população em níveis de pobreza, segundo denunciou ontem a Igreja) e uma difícil situação econômica. No final de agosto o Congresso decidirá se anula ou não o decreto que concedeu "superpoderes" aos Kirchner e começará a discutir um novo orçamento, no qual a oposição, majoritariamente de direita, exige mudanças radicais.
"Os argentinos querem ver a seus dirigentes políticos sentados numa mesa falando", assegura Francisco de Narváez, peronista crítico e um dos ganhadores de junho. "O país está desgovernado, mas isso não quer dizer que o governo da presidenta esteja terminado. Deve terminar seu mandato. Porém tem que atuar de outra forma. Não se pode esperar por 2011 para levar a cabo um ajuste econômico sério".
No meio do chamado ao diálogo, surpreenderam as declarações do próprio Narváez assegurando que imagina a "Néstor Kirchner na prisão" por delitos de corrupção. Para uns, devia ser interpretado como uma advertência, para que Kirchner se retire do primeiro plano. Para outros, foram umas palavras imprudentes, que colocam a presidenta numa posição difícil, porque ninguém pode imaginá-la na Casa Rosada com seu marido condenado por delitos tão sérios. (Na Argentina os deputados podem ser julgados, mesmo possuindo imunidades, que só impedem que sejam realmente presos sem autorização do Congresso).
Poucos dias depois de que seu marido perdera as eleições, Cristina Fernández anunciou uma reforma ministerial que a oposição criticou duramente, porque dava mais poder ao grupo de leais kirchneristas. Porém, 48 horas depois, Cristina Fernández lançou outra mensagem: estava disposta a abrir um diálogo com as forças políticas, econômicas e sociais para garantir a governabilidade do país. A rápida reação presidencial pegou desprevenida a oposição, temerosa de que se trate de uma manobra.
"A questão agora é definir a agenda e seus protagonistas", mantêm Narváez. Supõe-se que participariam os presidentes dos partidos políticos representados no Congresso, porém isso deixaria fora da mesa o próprio Narváez, que não ocupa outro cargo que o de deputado. Igualmente importante é fixar a agenda de debate. O ministro do Interior, Florencio Randazzo, muito próximo a Néstor Kirchner, aludiu incluso ao que até agora foi um tabu: falar dos impostos de exportação agrícola, que constituíram o pior fracasso presidencial.
Os olhares se dirigem ao novo ministro da Economia, Amado Boudou, um economista de 45 anos, próximo da presidenta, a quem se atribui crédito de bom gestor. "Boudou é um homem inteligente e, se não quer ser suicida, terá que convencer o matrimonio presidencial de que é imprescindível tomar medidas fiscais imediatas", explica o deputado peronista Eduardo Amadeo.
Nada mais tomar posse, Boudou deu a entender qual era sua principal preocupação: "Meu primeiro objetivo é conseguir financiamento para o governo". Sua obsessão pelo financiamento não é nova: como responsável da Seguridade Social, foi o responsável da nacionalização dos fundos de pensões privados, o que se interpretou como uma forma de injetar dinheiro fresco no governo.
"O resultado das eleições de junho criou uma situação nova, no sentido de que distribuiu o poder", explica Diego Guelar, do PRO (partido do Prefeito de Buenos Aires, Mauricio Macri). Porém, ninguém obteve um resultado tão claro como para proclamar-se único vencedor. Os radicais, que chegaram quase a desaparecer em 2001, experimentaram uma recuperação notável, porém ainda devem decidir se terão um único candidato para 2011, ou seja, se Elisa Carrió (da ‘Coalición Cívica’) aceita entrar debaixo do guarda-chuva de Julio Cobos, vice-presidente da Nação, e da ‘Unión Cívica Radical’, ou se se opta por um terceiro candidato, por exemplo, o governador socialista de Santa Fé, Hermes Binner.
No peronismo, as coisas estão ainda menos claras. Ninguém, nem Narváez, nem Carlos Reutemann quer que o Partido Justicialista celebre agora eleições internas. Todos estão de acordo em que necessitam tempo para "armar" (palavra favorita dos chefes do justicialismo) uma nova candidatura. Falta por ver se Kirchner aceita uma redução de poderes e até que ponto a ameaça de uma "espantada" ou de uma crise política é um jogo ou uma possibilidade real no horizonte.
Poucos dias depois de que seu marido perdera as eleições, Cristina Fernández anunciou uma reforma ministerial que a oposição criticou duramente, porque dava mais poder ao grupo de leais kirchneristas. Porém, 48 horas depois, Cristina Fernández lançou outra mensagem: estava disposta a abrir um diálogo com as forças políticas, econômicas e sociais para garantir a governabilidade do país. A rápida reação presidencial pegou desprevenida a oposição, temerosa de que se trate de uma manobra.
"A questão agora é definir a agenda e seus protagonistas", mantêm Narváez. Supõe-se que participariam os presidentes dos partidos políticos representados no Congresso, porém isso deixaria fora da mesa o próprio Narváez, que não ocupa outro cargo que o de deputado. Igualmente importante é fixar a agenda de debate. O ministro do Interior, Florencio Randazzo, muito próximo a Néstor Kirchner, aludiu incluso ao que até agora foi um tabu: falar dos impostos de exportação agrícola, que constituíram o pior fracasso presidencial.
Os olhares se dirigem ao novo ministro da Economia, Amado Boudou, um economista de 45 anos, próximo da presidenta, a quem se atribui crédito de bom gestor. "Boudou é um homem inteligente e, se não quer ser suicida, terá que convencer o matrimonio presidencial de que é imprescindível tomar medidas fiscais imediatas", explica o deputado peronista Eduardo Amadeo.
Nada mais tomar posse, Boudou deu a entender qual era sua principal preocupação: "Meu primeiro objetivo é conseguir financiamento para o governo". Sua obsessão pelo financiamento não é nova: como responsável da Seguridade Social, foi o responsável da nacionalização dos fundos de pensões privados, o que se interpretou como uma forma de injetar dinheiro fresco no governo.
"O resultado das eleições de junho criou uma situação nova, no sentido de que distribuiu o poder", explica Diego Guelar, do PRO (partido do Prefeito de Buenos Aires, Mauricio Macri). Porém, ninguém obteve um resultado tão claro como para proclamar-se único vencedor. Os radicais, que chegaram quase a desaparecer em 2001, experimentaram uma recuperação notável, porém ainda devem decidir se terão um único candidato para 2011, ou seja, se Elisa Carrió (da ‘Coalición Cívica’) aceita entrar debaixo do guarda-chuva de Julio Cobos, vice-presidente da Nação, e da ‘Unión Cívica Radical’, ou se se opta por um terceiro candidato, por exemplo, o governador socialista de Santa Fé, Hermes Binner.
No peronismo, as coisas estão ainda menos claras. Ninguém, nem Narváez, nem Carlos Reutemann quer que o Partido Justicialista celebre agora eleições internas. Todos estão de acordo em que necessitam tempo para "armar" (palavra favorita dos chefes do justicialismo) uma nova candidatura. Falta por ver se Kirchner aceita uma redução de poderes e até que ponto a ameaça de uma "espantada" ou de uma crise política é um jogo ou uma possibilidade real no horizonte.