quarta-feira, dezembro 24, 2008

'Bossa nova' e 'chanson' no Rio


'Bossa nova' e 'chanson' no Rio

Gilberto Gil e Charles Aznavour inauguram o ano da França no Brasil, junto aos presidentes Lula e Sarkozy

C. E. - Madrid – El País - 24/12/2008

Tradução de Antonio de Freitas

São os ícones musicais vivos de seus respectivos países. O músico francês Charles Aznavour e o brasileiro Gilberto Gil cantaram na terça-feira (23/12) para os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Nicolás Sarkozy no Rio de Janeiro. O concerto é a abertura do ano francês no Brasil, que se celebrará em 2009.

A homenagem à cultura francesa chega "em reciprocidade", saudável costume brasileiro, ao ano do Brasil que a França celebrou em 2005, no qual também participou Gil, então Ministro da Cultura brasileiro. O primeiro astro a subir no palco, de guitarra na mão, foi precisamente Gilberto Gil, que encerrou sua apresentação interpretando uma canção em francês. Aznavour, com sua tradicional camisa negra, arrancou aplausos com o tema Mourir d’aimer e foi acompanhado por todo o público no clássico La Bohème.

A primeira-dama da França, Carla Bruni, também se encontrava entre o público e acompanhou a Sarkozy em várias solenidades públicas durante a visita. Ontem, (23/12) ela foi parabenizada por dezenas de crianças pelo seu aniversário de 41 anos, na visita que realizou à favela do Pavão-Pavãozinho. Está previsto que Bruni aproveite sua viagem ao Brasil para encontrar-se com seu pai biológico Maurizio Remmert, que vive em São Paulo. Não há informações oficiais sobre quanto tempo ainda permanecerá o casal francês no Brasil, porém a imprensa local aposta no prolongamento da estada até o Ano Novo.

domingo, dezembro 21, 2008

Bolívia vence o analfabetismo


Bolívia vence o analfabetismo

O país se converte no terceiro país latino-americano a erradicar o analfabetismo, depois de Venezuela e Cuba.

AGENCIAS - Cochabamba – El País - 21/12/2008

Tradução de Antonio de Freitas Jr.

A Bolívia se converteu, após as experiências de Cuba e Venezuela, no terceiro país da América Latina a alcançar um dos Objetivos do Milênio propostos pela Organização das Nações Unidas - ONU: a erradicação do analfabetismo. Assim o afirmou neste sábado (20/12/2008) o presidente do país, Evo Morales, que durante uma solenidade em Cochabamba expressou sua satisfação pelo bom resultado dos programas desenvolvidos por seu governo.

Estes programas, que Morales transformou em ‘um assunto de Estado’, serviram para alfabetizar 819.417 pessoas, 99,5% do total de analfabetos que tinha o país, e aumentar assim o índice de alfabetização da Bolívia em algo mais que 96% de sua população.

Em 2001, um estudo do governo demonstrou que 14% dos bolivianos eram analfabetos e que quase 26% da população da zona rural não sabiam ler nem escrever.

"Foi o esforço humano, esse esforço de todos os dias durante três anos de trabalho, lutando com os participantes do programa para erradicar o analfabetismo na Bolívia. Este é um programa que chegou a todas as comunidades do país; foram quase 60.000 pessoas que colaboraram conosco para levar adiante este esforço", afirmou Morales, destacando também a ajuda, financeira e humana, aportada por Venezuela e Cuba.

De acordo com a Organização Educacional, Científica e Cultural da ONU (UNESCO), um país pode ser declarado "livre do analfabetismo" quando mais de 96% de seus adultos sabem ler e escrever. O representante da UNESCO, Eduard Matoko, afirmou durante esta solenidade em Cochabamba que "o projeto boliviano é um exemplo que seguramente vai inspirar a outros países a implantar programas similares".

Tal como expressou Morales, agora o desafio passa por ajudar, junto com seus homólogos Chávez e Castro, para que esta seja também uma realidade em Nicarágua e Paraguai.

quarta-feira, dezembro 17, 2008

Europa abandona o trabalhador

Europa abandona o trabalhador

Dois modelos se enfrentam amanhã na União Européia - UE: a jornada de 48 horas e a flexibilidade – O acordo privado entre empresas e empregados que propõe Brown pode dinamitar o sistema de proteção.

ANDREU MISSÉ – El País - 16/12/2008

Tradução de Antonio de Freitas

Europa é só um mercado ou é também um espaço de proteção social? As relações trabalhistas devem se estabelecer entre o trabalhador de maneira individual e o empresário como se tivessem igual capacidade para negociar ou devem ser fixadas de maneira coletiva? As leis trabalhistas devem ser apenas nacionais ou também européias?
Todas estas questões são as que estão no fundo do debate que estes dias se resolverá no Parlamento Europeu e que vai por em tensão as forças políticas. O incerto resultado da votação de amanhã - se requer maioria absoluta e as posições estão muito ajustadas - marcará também o caminho futuro que empreenderá a União Européia - UE. E, de maneira especial, a participação e o debate das próximas eleições européias de junho de 2009.
A ‘pedra de toque’ é a discussão sobre a duração máxima da jornada trabalhista, que atualmente é de 48 horas semanais. Caso prosperem as teses liberais que impulsionam o Reino Unido e seus aliados, os novos países do antigo bloco comunista, hoje se imporá a chamada “liberdade de opção”, que implica que a duração do tempo de trabalho será pactuada livremente entre empresário e trabalhador, e a jornada se poderá alongar até as 60 ou 65 horas segundo o caso.

"Com isto renasce a idéia de que o contrato de trabalho será um acordo entre o trabalhador e o empresário", adverte Alejandro Cercas, eurodeputado socialista espanhol, proponente da diretiva, que organizou a defesa dos direitos trabalhistas desde a trincheira do Parlamento Europeu. Cercas assegura que caso se generaliza a exclusão voluntaria, "não haverá leis, não haverá convenções, e será o fim dos sindicatos". "Isto é só a ponta do iceberg. Começamos pela jornada e logo virão os salários e os demais direitos trabalhistas", adverte.
Em sua opinião, a desregulamentação trabalhista supõe dinamitar os princípios da primeira convenção internacional sobre as condições de trabalho. Quando se criou a Organização Internacional do Trabalho (OIT) em 1919, estabeleceu-se a jornada trabalhista de no máximo oito horas e a semana trabalhista de 48 horas.

A batalha entre as duas idéias na Europa está sendo muito intensa. Mais de 50 diplomatas britânicos foram mobilizados por toda a UE para lograr que os deputados dos demais países façam avançar o modelo liberal. A pugna provocou a divisão interna entre os grandes partidos PPE e PSE, e parece que a vanguarda ficará com o Reino Unido e os novos países da ampliação, exceto Hungria, por um lado, e a velha Europa por outro.
Os britânicos tentam atrair os votos dos antigos países comunistas do Leste europeu advertindo de que a UE quer retirar-lhes as vantagens competitivas ao dispor de uma legislação trabalhista menos exigente.

Na Espanha, contudo, todos os grupos parlamentares do Congresso votaram no outono passado de maneira unânime contrários à introdução do ‘opting out’ ou liberdade de opção.
O proponente assinalou que "os temores ante a globalização e as tentativas de certos países de lograr vantagens competitivas graças a longas jornadas de trabalho podem contar com apoios nas instituições européias, até agora comprometidas com ganhar a batalha da concorrência sobre a base da excelência e não sobre a base de desmantelar o modelo social do pós-guerra, nem sobre o ‘dumping’ social entre Estados".
"O debate", afirma um dos negociadores comunitários, "é um assunto ideológico, é entre os que querem mais regulação ou menos regulação, entre os que querem mais Europa ou menos Europa". "Estou convencido", completa, "de que 70% dos que votarão contra o ‘informe Cercas’ são ‘euroescéticos’".
A história recente se remonta a 1993, quando a UE aprovou uma diretiva que, pela primeira vez, estabeleceu o máximo de 48 horas de trabalho por semana, e definiu o tempo de descanso e de férias. O Governo de John Major obteve o ‘opting out’ ou exclusão voluntária por um período temporal de 10 anos. Os resultados conseguidos no Reino Unido são ilustrativos: mais de 3,2 milhões de trabalhadores trabalham mais de 48 horas, dos quais cerca de meio milhão trabalha mais de 60 horas.
Um estudo da Comissão Barnard, Deakin e Hobbs, da Universidade de Cambridge, destacou o alongamento da jornada trabalhista e seus efeitos sobre a saúde dos trabalhadores após a aprovação do ‘opting out’ individual no Reino Unido. A taxa de trabalhadores com horários de mais de 48 horas semanais se eleva a 17%, ainda que superada pela Grécia (32%) e Polônia (23%).

Uma pesquisa realizada à pedido dos sindicatos britânicos TUC indica que quem "trabalha mais de 60 horas semanais, e talvez mais de 50, têm maior risco de doença cardiovascular". A mesma pesquisa demonstra ainda que "o excesso de jornadas superiores às 48 horas, reduz a satisfação trabalhista e aumenta significativamente o risco de problemas de saúde mental".
No conjunto da União, as longas jornadas trabalhistas são um fenômeno predominantemente masculino, com uma taxa que chega a 29% da população ocupada, o dobro que as mulheres. Neste sentido, a Confederação Européia de Sindicatos (CES) assinala que "voltar às jornadas trabalhistas longas e insalubres, assim como a uma divisão tradicional do trabalho entre homens e mulheres, obstaculizaria a plena participação destas no mercado de trabalho e teria uma influencia negativa nos jovens pais na hora de tratar de conciliar o trabalho com a vida familiar".
O CES e outras organizações sindicais européias convocaram para hoje (16/12) uma manifestação em Estrasburgo na que participarão milhares de sindicalistas de toda Europa e que reproduz o clima de mal estar trabalhista que já se suscitou com a diretiva de serviços, conhecida também como ‘diretiva Bolkestein’, pelo nome do comissário que a promoveu, e que muitos associam ao rechaço da Constituição européia na França.
O conflito envolveu profundamente às organizações empresariais, que destacam as vantagens da contratação individual. Um documento firmado pelas patronais européias ‘Businesseurope’ e ‘UAEMP’, junto a ‘Eurocâmaras’ e o ‘Centro Europeu de Estudos Profissionais’, assinala que "os responsáveis pelas empresas não utilizam a possibilidade dos empregados trabalharem constantemente mais horas, porém apenas para atender as flutuações temporais da demanda". Para os empresários "os assalariados que firmem o ‘opting out’ também se beneficiam na medida em que podem trabalhar horas extras, por exemplo, e complementar seus salários, o que é uma consideração significativa nas atuais circunstâncias econômicas".
A duração do tempo de trabalho foi especialmente polêmica em alguns coletivos como os médicos e os bombeiros. No caso dos médicos, que junto aos estudantes de medicina formam um coletivo de mais de três milhões de profissionais, o recurso aos tribunais representou um importante respaldo para a defesa de seus interesses.
O Tribunal das Comunidades Européias, com sede em Luxemburgo, decidiu a favor dos profissionais da medicina em três sentenças; “Sindicato de Médicos de Assistência Pública (Simap)”, em 2000; e, posteriormente, nas decisões judiciais dos casos Jaeger e Pfeiffer. Nestas três resoluções judiciais do tribunal da UE ficou estabelecido que o tempo de plantão deveria ser considerado tempo de trabalho porque o empregado estava à disposição do empresário e, portanto, não podia dispor do tempo livre. Os Estados sustentam que a consideração do tempo de plantão dos médicos como tempo de trabalho provocaria a quebra dos sistemas de saúde pública em muitos países.
Nas negociações entre a Comissão e o Conselho para revisar a diretiva de 1993 e ter em conta as mencionadas sentenças introduziram o conceito de tempo de plantão distinguindo entre um período ativo e um período inativo. Segundo o Conselho, este último não deve ser considerado como trabalho.
Por sua vez, a proposta elaborada pelo Parlamento considera que todo o tempo de plantão "incluída a parte inativa" deve ser considerada como tempo de trabalho. Porém, admite que através de convenções entre as partes ou regulamentações trabalhistas este tempo de plantão pode ser computado de maneira distinta de forma que não infrinja o máximo das 48 horas semanais. Ontem várias centenas de médicos se manifestaram em Estrasburgo, e vários milhares em toda Europa, para lograr que se reconheça seu trabalho. Claude Wetzel, presidente da Federação Européia de Médicos Assalariados, manifestou: "As medidas da diretiva ameaçam claramente a nossa saúde e a de nossos pacientes". Citou um estudo de 2002, que demonstrava que "depois de 24 horas de trabalho uma pessoa tem as reações equivalentes a alguém que tenha uma taxa de álcool no sangue de 0,8%".
O comissário de Emprego e Assuntos Sociais, Vladímir Spidla, interveio ontem no plenário para exigir um acordo entre os deputados e os Estados para acabar com a insegurança jurídica sobre os plantões médicos, e apelou ao "realismo dos ‘eurodeputados’". Para os facultativos, a solução está em ampliar as equipes para poder realizar o trabalho nas condições devidas.
A diretiva havia permanecido bloqueada até agora pela oposição da Espanha, França e Itália. Com a chegada de Nicolas Sarkozy e Silvio Berlusconi ao poder em seus respectivos países se quebrou a defesa ante a enxurrada de liberalismo e desregulamentação.
Na última decisão do Conselho no passado junho só Espanha e Grécia votaram contra. Abstiveram-se Bélgica, Chipre, Malta, Portugal e Hungria. Insuficientes para deter o ‘opting out’.
A disputa se verá amanhã no plenário do Parlamento. Para evitar que se rompa o limite de 48 horas e a semana trabalhista possa se alongar até as 65 é preciso que prospere alguma das emendas apresentadas, o que requer a maioria absoluta, equivalente a 393 votos. As pesquisas estão muito ajustadas, pendentes de 15 ou 20 votos.
Properando alguma emenda haverá que abrir um período de conciliação que pode durar até três meses. Quanto mais se alongue, mais se acerca a discussão das eleições do Parlamento Europeu do próximo junho, e, portanto as possibilidades de que influa nas opiniões dos votantes, em sua maioria trabalhadores e profissionais afetados pela diretiva.

Em sua intervenção ontem, Cercas destacou: "Temos ante nós uma oportunidade para conectar com as preocupações de nossa cidadania". "Europa não é um escuro labirinto de egoístas ilustrados nem de políticos sem coração e não estamos surdos nem mudos. Ao contrario, nossos cidadãos verão que sabemos pôr os direitos e a maioria na frente da cobiça e o desvario de uns poucos ideólogos da extrema desregulamentação".
Valérie Létard, secretaria de Estado do Ministro de Trabalho e Relações Sociais da França, defendeu o compromisso alcançado na posição comum, auspiciado pela maioria de Estados. Em sua opinião, se "trata de um avance para a situação dos trabalhadores europeus”.
A proposta do Parlamento elaborada por Cercas oferece uma ampla flexibilidade como que o ‘opting out’ não desapareça até dentro de três anos.
A ‘Eurocâmara’ rechaça ampliar a 65 horas a jornada laboral

Aprovadas, por maioria absoluta, varias emendas que bloqueiam a diretiva de tempo de trabalho. - O Parlamento Europeu e os governos terão que voltar a negociar em um período de 90 dias
AGENCIAS - Estrasburgo – El País - 17/12/2008

Tradução de Antonio de Freitas
O Parlamento Europeu rechaçou ampliar a jornada semanal de trabalho a 65 horas. Os ‘eurodeputados’ deram seu apoio a uma emenda de um parlamentar espanhol que, de fato, paralisa a chamada diretiva das 65 horas e obriga os governos dos 27 a voltarem a negociar. A norma, aprovada pelos ministros de trabalho da UE, previa eliminar o limite máximo da jornada laboral semanal, fixado em 48 horas, e dar liberdade para que empresário e trabalhador acordem o tempo de trabalho, com um máximo de 60 ou 65 horas, segundo os casos, e era considerada como um retrocesso nos direitos trabalhistas.

O Parlamento aprovou por maioria absoluta uma série de emendas que corrigem o aprovado pelos ministros de Trabalho, pelo que obrigam a estes a voltarem a redigi-la e bloqueiam, por tanto, a aprovação da diretiva das 65 horas. Agora, se abre um novo período de negociação de 90 dias (denominado "de conciliação") entre o Parlamento e o Conselho ao cabo do qual, se não houver acordo, decai o texto.

quarta-feira, dezembro 10, 2008

O complicado caminho da democracia argentina


O complicado caminho da democracia argentina

Aniversário de 25 anos da posse de Alfonsín

SOLEDAD GALLEGO-DÍAZ - Buenos Aires
El País - 10/12/2008

Tradução de Antonio de Freitas

Argentina completa hoje 25 anos de vida democrática, um longo caminho até a normalização institucional que começou em 10 de dezembro de 1983 com a posse de Raúl Alfonsín, após sete anos de feroz ditadura militar. Um quarto de século depois, Alfonsín se converteu no símbolo da democracia e a seus 81 anos, enfermo, é um dos poucos personagens da vida política argentina que congrega a homenagem de praticamente todo o país. A sociedade argentina, por sua parte, enfrenta a uma enésima crise econômica no meio de um panorama de partidos muito debilitados e de duros enfrentamentos políticos entre o Governo e a oposição.

Para os argentinos foram 25 anos agitados, às vezes desatinados, com perigosos períodos de instabilidade e com profundas crises, como a provocada pelo ‘corralito’ de 2001 que acabou com a poupança da classe media, mas, enfim, 25 anos de vigência constitucional e de sucessão legal do poder executivo.

A última aparição pública de Alfonsín foi no 1º de outubro passado, quando assistiu a uma inesperada homenagem que lhe proporcionou a atual presidenta, Cristina Fernández de Kirchner, ao colocar seu busto em bronze na galeria da Casa Rosada. "O Senhor é o símbolo do retorno da democracia e é justo prestar-lhe uma homenagem, aos 25 anos de democracia e ao Senhor, por se dedicar, se abraçar a sua causa", disse uma emocionada Cristina Fernández.

Poucos dias depois, em 30 de outubro, o ex-presidente se dirigiu através de uma mensagem gravada a mais de 10.000 pessoas reunidas no histórico Luna Park, de Buenos Aires. Alfonsín comoveu com um discurso no qual conclamou à concórdia nacional: "Temos que querer-nos mais entre todos os argentinos porque através do esforço comum é que poderemos resolver nossos problemas". O ex-presidente recordou que não se constrói a democracia sobre a base da destruição de tudo o pré-existente, algo muito habitual, disse, na vida política da República. Alfonsín pediu unidade entre a oposição radical (muito dividida) e diálogo com o Governo de Fernández (algo quase impossível no atual momento de grande enfrentamento político).

A presidência de Raúl Alfonsín durou de 1983 a 1989, e teve que enfrentar-se à reconstrução de um país destruído por uma ditadura militar que havia causado 30.000 mortos, assassinados e desaparecidos, e por uma guerra insensata para a recuperação das ilhas Malvinas. O político radical, advogado e defensor dos diretos humanos não teve o apoio de todos os que agora dizem admirar-lhe e agradecem seu empenho: pelo contrário, teve que lutar contra todo tipo de conspirações e manobras desestabilizadoras.

Alfonsín pôs em marcha a chamada ‘Comissão sobre a Desaparição das Pessoas’, que fez público o estremecedor informe ‘Nunca Más’ e conseguiu que fossem processados os principais responsáveis da ditadura, Jorge Videla, Emilio Massera, Ramón Agosti e outros militares que foram inicialmente condenados. Não suportou, contudo, as pressões e aceitou aprovar imediatamente as chamadas Leis de Ponto Final e Obediência Devida, que deixaram fora da cadeia a quase todos os assassinos com uniforme. Videla e seus ‘amigotes’ não puderam voltar a ser julgados até a chegada ao poder de Néstor Kirchner, quando se pôs em marcha, de novo, a persecução penal de alguns daqueles delitos.

O ex-presidente esteve permanentemente ameaçado por levantamentos militares, o mais conhecido dos quais foi o protagonizado pelos ‘carapintadas’ no quartel de ‘La Tablada’, e sofreu o desafio da hiperinflação, à qual não soube pôr freio. Alguns dias antes de acabar realmente sua presidência, a trancos e barrancos, conseguiu entregar seu mandato a outro presidente civil, Carlos Menem. Contudo, era a primeira vez que algo assim sucedia na Argentina desde 1916. A posse de Alfonsín marca o inicio do mais extenso período democrático ininterrupto da historia da República.

Não tiveram o mesmo sucesso suas tentativas de acabar com a imoralidade pública. "Vamos fazer um Governo decente", prometeu Alfonsín na varanda do ‘Cabildo’ naquele dia 10 de dezembro. Talvez seu mandato tenha o sido, porém a segunda etapa, com Menem à frente, deu origem a um dos maiores períodos de corrupção na Argentina. A sucessão de Menem e do extraordinariamente incompetente Fernando de la Rúa provocou ademais uma crise política, com a louca rotação de cinco presidentes da República em duas semanas, até a surpreendente vitoria eleitoral de Néstor Kirchner, que estabilizou a situação.

O importante, segundo o próprio Alfonsín, é que, a pesar de todas as frustrações, se conseguiu completar 25 anos de democracia. Para que seja possível completar os próximos 25, assegura, haverá que recompor a vida dos partidos políticos argentinos (o Radical praticamente desapareceu com De la Rúa) e lograr o desenvolvimento de uma maior cultura cívica, que impeça a corrupção e promova o fortalecimento das instituições. Uma tarefa difícil para uma sociedade muito combativa, porém muito cansada, reconhece o ex-presidente.

terça-feira, novembro 25, 2008

A mesa desordenada de Albert Einstein


A mesa desordenada de Albert Einstein

Periodista Digital – Ciencia y Medio Ambiente – 25-11-08

Tradução de Antonio de Freitas

(PD).- Pilhas de papeis, envelopes e fórmulas escritas pela metade. Estas imagens da mesa de Albert Einstein em seu escritório de Princeton foram publicadas pela revista ‘Life’ em 1955, poucos meses antes de sua morte.

Nelas - como nos explica
Aberrón en Fogonazos- podemos contemplar um quadro-negro cheio de equações, um montão de revistas velhas e até seu próprio cachimbo abandonado momentaneamente sobre um dos cadernos.

Se alguém presta atenção pode ver o que parece um tinteiro, alguns livros, um exemplar de uma revista de Filosofia e até um cinzeiro de cristal.

Debaixo dos montões de papeis se vislumbram canetas perdidas e cartas sem abrir, documentos que talvez contenham a chave da teoria unificada, na qual investiu sem sucesso os últimos anos de sua vida. No centro da imagem há uma fotografia do que parece uma praça, sem pessoas. Em que estava pensando Einstein minutos antes que chegasse o fotógrafo?

Sobre as vantagens e incovenientes de se ter uma mesa desordenada já se escreveram autênticos tratados, alguns dos quais sustentam que o caos pode ser mais produtivo que uma ordem demasiada estrita. Contudo, nada como a citação atribuída ao próprio Einstein para pôr as coisas no seu lugar: "Se uma mesa abarrotada é sintoma de uma mente abarrotada, então o que devemos pensar de uma vazia?"

segunda-feira, novembro 17, 2008

Comunicado final da Cúpula do G-20

Comunicado final da Cúpula do G-20

O G-20 é formado pela 19 maiores economias do planeta e a União Européia: África do Sul, Alemanha*, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá*, China, Coreia do Sul, Estados Unidos*, França*, Índia, Indonésia, Itália*, Japão*, México, Reino Unido*, Rússia, Turquia *(G7).

O G-20 declarou neste sábado, 15 de novembro, “decidido a reforçar sua cooperação” para restaurar o crescimento mundial e reformar o sistema financeiro, em um comunicado oficial divulgado ao término da reunião de cúpula, em Washington.

No documento, os líderes do grupo - cujos países representam 85% da economia mundial - se comprometem a aplicar medidas fiscais para estimular as economias nacionais, e lista seis áreas que devem ser priorizadas antes de 31 de março de 2009.

DECLARAÇÃO

ENCONTRO SOBRE MERCADOS FINANCEIROS E ECONOMIA MUNDIAL


1. Nós, líderes do Grupo dos Vinte, conduzimos uma reunião inicial em Washington em 15 de novembro de 2008, em meio aos sérios desafios à economia do mundo e aos mercados financeiros. Estamos determinados a reforçar nossa cooperação e trabalhar juntos para restaurar o crescimento global e alcançar as reformar necessárias nos sistemas
financeiros mundiais.

2. Nos últimos meses nossos países têm tomado medidas urgentes e excepcionais para apoiar a economia global e estabilizar os mercados financeiros. Esses esforços devem continuar. Ao mesmo tempo, devemos criar as bases de reformas para ajudar a assegurar que uma crise global, como essa de agora, não ocorra novamente. Nosso trabalho será guiado pela visão compartilhada de que os princípios do mercado, comércio aberto, regimes de investimento e mercados financeiros efetivamente regulados estimulam o dinamismo, inovação e empreendedorismo que são essenciais para o crescimento da economia, emprego e redução da pobreza.

Raízes e causas da atual crise

3. Durante um período de forte crescimento global, crescimento no fluxo de capital e prolongada estabilidade no início desta década, os participantes
do mercado procuraram retornos maiores sem uma adequada avaliação dos riscos e falharam em adotar os procedimentos de due diligence. Ao mesmo tempo, padrões fracos de subscrição, práticas não saudáveis de gerenciamento de risco, produtos financeiros cada vez mais opacos e complexos, e consequente alavancagem excessiva combinaram para criar vulnerabilidade no sistema. Os formuladores de política, reguladores e supervisores em alguns países desenvolvidos, não avaliaram adequadamente os riscos que se criavam nos mercados financeiros, o ritmo com a inovação financeira, ou levaram em conta as ramificações sistêmicas das ações regulatórias domésticas.

4. Dentre os fatores principais para a atual situação estão, entre outros, insuficientes e inconsistentes políticas macroeconômicas coordenadas, reformas estruturais inadequadas, que levaram a insustentáveis conseqüências macroeconômicas. Esses desenvolvimentos, juntos, contribuíram para excessos e resultaram no final em severos rompimentos do mercado.

Ações tomadas e a serem tomadas

5. Temos tomado fortes e significativas ações até o momento para estimular nossas economias, oferecer liquidez, reforçar o capital de instituições financeiras, proteger poupanças e depósitos, reparar deficiências regulatórias, descongelar mercados de crédito e estamos trabalhando para assegurar que instituições financeiras internacionais (IFIs) possam oferecer apoio crucial para a economia global.

Mas é preciso fazer mais para estabilizar os mercados financeiros e estimular o crescimento econômico. O impulso econômico está desacelerando substancialmente nas principais economias e a perspectiva global se enfraqueceu. Muitas economias emergentes, que ajudaram a sustentar a economia mundial nesta década, ainda gozam de bom crescimento, mas cada vez mais são impactadas pelo desaquecimento global.

7. Contra este cenário de deterioração das condições econômicas, concordamos que uma resposta mais ampla de política é necessária, baseada em cooperação macroeconômica mais próxima para restaurar crescimento, evitar espirais negativas e apoiar as economias emergentes e países em desenvolvimento. Como medidas imediatas para atingir esses objetivos
, bem como enfrentar desafios futuros, iremos:

Continuar nossos vigorosos esforços e tomar mais ações que forem necessárias para estabilizar o sistema financeiro.

Reconhecer a importância do apoio da política monetária, conforme apropriado para condições domésticas.

Usar medidas fiscais para estimular a demanda doméstica com efeito rápido, como apropriado, enquanto se mantém uma política que conduza à estabilidade fiscal.

Ajudar economias emergentes e em desenvolvimento a obter acesso aos financiamentos nas difíceis atuais condições financeiras, incluindo através de instrumentos de liquidez e programas de apoio. Ressaltamos o papel importante do Fundo Monetário Internacional (FMI) em resposta à crise, saudamos sua nova linha de liquidez de curto prazo e apelamos para que a atual revisão de seus instrumentos assegure flexibilidade.

Encorajar o Banco Mundial e outros bancos multilaterais de desenvolvimento (MDBs, na sigla em inglês) a usarem sua capacidade total para apoiar seu plano de desenvolvimento, e elogiamos a recente introdução de novos instrumentos pelo Banco Mundial nas áreas de infra-estrutura e negociação financeira.

Garantir que FMI, Banco Mundial e outros MDBs tenham recursos suficientes para continuar desempenhando seus papéis na superação da crise.

quinta-feira, novembro 06, 2008

Discurso completo de Barack Obama - Presidente eleito dos EUA

"Olá, Chicago!

Se alguém aí ainda duvida de que os Estados Unidos são um lugar onde tudo é possível, que ainda se pergunta se o sonho de nossos fundadores continua vivo em nossos tempos, que ainda questiona a força de nossa democracia, esta noite é sua resposta.

É a resposta dada pelas filas que se estenderam ao redor de escolas e igrejas em um número como esta nação jamais viu, pelas pessoas que esperaram três ou quatro horas, muitas delas pela primeira vez em suas vidas, porque achavam que desta vez tinha que ser diferente e que suas vozes poderiam fazer esta diferença.

É a resposta pronunciada por jovens e idosos, ricos e pobres, democratas e republicanos, negros, brancos, hispânicos, indígenas, homossexuais, heterossexuais, incapacitados ou não-incapacitados.

Americanos que transmitiram ao mundo a mensagem de que nunca fomos simplesmente um conjunto de indivíduos ou um conjunto de estados vermelhos e estados azuis.

Somos, e sempre seremos, os Estados Unidos da América.

É a resposta que conduziu aqueles que durante tanto tempo foram aconselhados por tantos a serem céticos, temerosos e duvidosos sobre o que podemos conseguir para colocar as mãos no arco da História e torcê-lo mais uma vez em direção à esperança de um dia melhor.

Demorou um tempo para chegar, mas esta noite, pelo que fizemos nesta data, nestas eleições, neste momento decisivo, a mudança chegou aos EUA.

Esta noite, recebi um telefonema extraordinariamente cortês do senador McCain.

O senador McCain lutou longa e duramente nesta campanha. E lutou ainda mais longa e duramente pelo país que ama. Agüentou sacrifícios pelos EUA que sequer podemos imaginar. Todos nos beneficiamos do serviço prestado por este líder valente e abnegado.

Parabenizo a ele e à governadora Palin por tudo o que conseguiram e desejo colaborar com eles para renovar a promessa desta nação durante os próximos meses.

Quero agradecer a meu parceiro nesta viagem, um homem que fez campanha com o coração e que foi o porta-voz de homens e mulheres com os quais cresceu nas ruas de Scranton e com os quais viajava de trem de volta para sua casa em Delaware, o vice-presidente eleito dos EUA, Joe Biden.

E não estaria aqui esta noite sem o apoio incansável de minha melhor amiga durante os últimos 16 anos, a rocha de nossa família, o amor da minha vida, a próxima primeira-dama da nação, Michelle Obama.

Sasha e Malia amo vocês duas mais do que podem imaginar. E vocês ganharam o novo cachorrinho que está indo conosco para a Casa Branca.

Apesar de não estar mais conosco, sei que minha avó está nos vendo, junto com a família que fez de mim o que sou. Sinto falta deles esta noite. Sei que minha dívida com eles é incalculável.

A minha irmã Maya, minha irmã Auma, meus outros irmãos e irmãs, muitíssimo obrigado por todo o apoio que me deram. Sou grato a todos vocês. E a meu diretor de campanha, David Plouffe, o herói não reconhecido desta campanha, que construiu a melhor campanha política, creio eu, da história dos Estados Unidos da América.

A meu estrategista chefe, David Axelrod, que foi um parceiro meu a cada passo do caminho.

À melhor equipe de campanha formada na história da política. Vocês tornaram isto realidade e estou eternamente grato pelo que sacrificaram para conseguir.

Mas, sobretudo, não esquecerei a quem realmente pertence esta vitória. Ela pertence a vocês. Ela pertence a vocês.

Nunca pareci o candidato com mais chances. Não começamos com muito dinheiro nem com muitos apoios. Nossa campanha não foi idealizada nos corredores de Washington. Começou nos quintais de Des Moines e nas salas de Concord e nas varandas de Charleston.

Foi construída pelos trabalhadores e trabalhadoras que recorreram às parcas economias que tinham para doar US$ 5, ou US$ 10 ou US$ 20 à causa.

Ganhou força dos jovens que negaram o mito da apatia de sua geração, que deixaram para trás suas casas e seus familiares por empregos que os trouxeram pouco dinheiro e menos sono.

Ganhou força das pessoas não tão jovens que enfrentaram o frio gelado e o ardente calor para bater nas portas de desconhecidos, e dos milhões de americanos que se ofereceram como voluntários e organizaram e demonstraram que, mais de dois séculos depois, um Governo do povo, pelo povo e para o povo não desapareceu da Terra.

Esta é a vitória de vocês.

Além disso, sei que não fizeram isto só para vencerem as eleições. Sei que não fizeram por mim.

Fizeram porque entenderam a magnitude da tarefa que há pela frente. Enquanto comemoramos esta noite, sabemos que os desafios que nos trará o dia de amanhã são os maiores de nossas vidas - duas guerras, um planeta em perigo, a pior crise financeira em um século.

Enquanto estamos aqui esta noite, sabemos que há americanos valentes que acordam nos desertos do Iraque e nas montanhas do Afeganistão para dar a vida por nós.

Há mães e pais que passarão noites em claro depois que as crianças dormirem e se perguntarão como pagarão a hipoteca ou as faturas médicas ou como economizarão o suficiente para a educação universitária de seus filhos.

Há novas fontes de energia para serem aproveitadas, novos postos de trabalho para serem criados, novas escolas para serem construídas e ameaças para serem enfrentadas, alianças para serem reparadas.

O caminho pela frente será longo. A subida será íngreme. Pode ser que não consigamos em um ano nem em um mandato. No entanto, EUA, nunca estive tão esperançoso como estou esta noite de que chegaremos.

Prometo a vocês que nós, como povo, conseguiremos.

Haverá percalços e passos em falso. Muitos não estarão de acordo com cada decisão ou política minha quando assumir a presidência. E sabemos que o Governo não pode resolver todos os problemas.

Mas, sempre serei sincero com vocês sobre os desafios que nos afrontam. Ouvirei a vocês, principalmente quando discordarmos. E, sobretudo, pedirei a vocês que participem do trabalho de reconstruir esta nação, da única forma como foi feita nos EUA durante 221 anos, bloco por bloco, tijolo por tijolo, mão calejada sobre mão calejada.

O que começou há 21 meses em pleno inverno não pode acabar nesta noite de outono.

Esta vitória em si não é a mudança que buscamos. É só a oportunidade para que façamos esta mudança. E isto não pode acontecer se voltarmos a como era antes. Não pode acontecer sem vocês, sem um novo espírito de sacrifício.

Portanto façamos um pedido a um novo espírito do patriotismo, de responsabilidade, em que cada um se ajuda e trabalha mais e se preocupa não só com si próprio, mas um com o outro.

Lembremos que, se esta crise financeira nos ensinou algo, é que não pode haver uma Wall Street (setor financeiro) próspera enquanto a Main Street (comércio ambulante) sofre.

Neste país, avançamos ou fracassamos como uma só nação, como um só povo. Resistamos à tentação de recair no partidarismo, na mesquinharia e na imaturidade que intoxicaram nossa vida política há tanto tempo.

Lembremos que foi um homem deste estado que levou pela primeira vez a bandeira do Partido Republicano à Casa Branca, um partido fundado sobre os valores da auto-suficiência e da liberdade do indivíduo e da união nacional.

Estes são valores que todos compartilhamos. E enquanto o Partido Democrata conquistou uma grande vitória esta noite, fazemos com certa humildade e a determinação para curar as divisões que impediram nosso progresso.

Como disse Lincoln a uma nação muito mais dividida que a nossa, não somos inimigos, mas amigos. Embora as paixões os tenham colocado sob tensão, não devem romper nossos laços de afeto.

E àqueles americanos cujo apoio eu ainda devo conquistar, pode ser que eu não tenha conquistado seu voto hoje, mas ouço suas vozes. Preciso de sua ajuda e também serei seu presidente.

E a todos aqueles que nos vêem esta noite além de nossas fronteiras, em Parlamentos e palácios, a aqueles que se reúnem ao redor dos rádios nos cantos esquecidos do mundo, nossas histórias são diferentes, mas nosso destino é comum e começa um novo amanhecer de liderança americana.

A aqueles que pretendem destruir o mundo: vamos vencê-los. A aqueles que buscam a paz e a segurança: apoiamo-nos.

E a aqueles que se perguntam se o farol dos EUA ainda ilumina tão fortemente: esta noite demonstramos mais uma vez que a força autêntica de nossa nação vem não do poderio de nossas armas nem da magnitude de nossa riqueza, mas do poder duradouro de nossos ideais: democracia, liberdade, oportunidade e firme esperança.

Lá está a verdadeira genialidade dos EUA: que o país pode mudar. Nossa união pode ser aperfeiçoada. O que já conseguimos nos dá esperança sobre o que podemos e temos que conseguir amanhã.

Estas eleições contaram com muitos inícios e muitas histórias que serão contadas durante séculos. Mas uma que tenho em mente esta noite é a de uma mulher que votou em Atlanta.

Ela se parece muito com outros que fizeram fila para fazer com que sua voz seja ouvida nestas eleições, exceto por uma coisa: Ann Nixon Cooper tem 106 anos.

Nasceu apenas uma geração depois da escravidão, em uma era em que não havia automóveis nas estradas nem aviões nos céus, quando alguém como ela não podia votar por dois motivos - por ser mulher e pela cor de sua pele.

Esta noite penso em tudo o que ela viu durante seu século nos EUA - a desolação e a esperança, a luta e o progresso, às vezes em que nos disseram que não podíamos e as pessoas que se esforçaram para continuar em frente com esta crença americana: Podemos.

Em uma época em que as vozes das mulheres foram silenciadas e suas esperanças descartadas, ela sobreviveu para vê-las serem erguidas, expressarem-se e estenderem a mão para votar. Podemos.

Quando havia desespero e uma depressão ao longo do país, ela viu como uma nação conquistou o próprio medo com uma nova proposta, novos empregos e um novo sentido de propósitos comuns. Podemos.

Quando as bombas caíram sobre nosso porto e a tirania ameaçou ao mundo, ela estava ali para testemunhar como uma geração respondeu com grandeza e a democracia foi salva. Podemos.

Ela estava lá pelos ônibus de Montgomery, pelas mangueiras de irrigação em Birmingham, por uma ponte em Selma e por um pregador de Atlanta que disse a um povo: "Superaremos". Podemos.

O homem chegou à lua, um muro caiu em Berlim e um mundo se interligou através de nossa ciência e imaginação.

E este ano, nestas eleições, ela tocou uma tela com o dedo e votou, porque após 106 anos nos EUA, durante os melhores e piores tempos, ela sabe como os EUA podem mudar.

Podemos.

EUA avançamos muito. Vimos muito. Mas há muito mais por fazer. Portanto, esta noite vamos nos perguntar se nossos filhos viverão para ver o próximo século, se minhas filhas terão tanta sorte para viver tanto tempo quanto Ann Nixon Cooper, que mudança virá? Que progresso faremos?

Esta é nossa oportunidade de responder a esta chamada. Este é o nosso momento. Esta é nossa vez.

Para dar emprego a nosso povo e abrir as portas da oportunidade para nossas crianças, para restaurar a prosperidade e fomentar a causa da paz, para recuperar o sonho americano e reafirmar esta verdade fundamental, que, de muitos, somos um, que enquanto respirarmos, temos esperança.

E quando nos encontrarmos com o ceticismo e as dúvidas, e com aqueles que nos dizem que não podemos, responderemos com esta crença eterna que resume o espírito de um povo: Podemos.

Obrigado. Que Deus os abençoe. E que Deus abençoe os Estados Unidos da América".

Discurso completo do Presidente eleito dos Estados Unidos, Barack Obama, diante de mais de 100 mil pessoas no Grant Park de Chicago (Illinois), às 23h locais, 3h da madrugada do dia 05 de novembro de 2008, horário de Brasília.

terça-feira, novembro 04, 2008

Todo Obama


Todo Obama

LLUÍS BASSETS – El País - 01/11/2008

Tradução de Antonio de Freitas

Os dois livros publicados pelo candidato democrata nas eleições de terça-feira nos EUA possuem uma escrita brilhante e esclarecedora. Aí está seu ideário político, seu estilo conciliador, sua empatia pelas opiniões alheias e também um recorrido vital mais radical que suas idéias.

Tão difícil quanto conduzir a própria vida é conduzir a própria biografia. Em política, é más freqüente tropeçar com o político que é vítima de sua biografia que o contrario, uma biografia que apareça como a cuidada construção de uma personalidade sob cujo controle se desenvolve tanto a escrita sobre sua peripécia vital como a própria peripécia vital que lhe serve de base. Barack Obama, esse político que combina uma oratória emotiva e cálida com uma personalidade fria e tranqüila, é na atualidade um exemplo de maestria autobiográfica que permite modelar a própria vida como uma cuidada narração. Esta circunstância tem maior relevância no caso do candidato democrata à presidência dos Estados Unidos porque esta eleição e este tempo são os da utilização da vida como mensagem política. A mensagem política que funciona na época pós-ideológica e pós-política tem a forma de um relato aceitável e funcional que os cidadãos podem utilizar como identificador e orientador em suas vidas e em seus comportamentos eleitorais. O político pós-moderno necessita contar com uma potente biografia, capaz de sintonizar com as maiorias que devem lhe apoiar, e ao mesmo tempo, deve saber contar suas idéias políticas através de relatos, de historias concretas, com rostos, nomes, sobrenomes e alento vital.

Barack Obama demonstrou até agora que está extraordinariamente dotado para a política contemporânea. Em primeiro lugar, porque quando tinha apenas 33 anos e apenas podia intuir que algum dia se dedicaria à política parlamentar e chegaria a brigar pela presidência dos Estados Unidos, soube escrever uma indagação sobre sua identidade pessoal e familiar, dando-lhe a forma de um relato autobiográfico, que se converteu num sucesso editorial. Mais tarde, porque soube pôr sua própria historia biográfica a serviço de uma rápida e brilhante carreira política, cuja coroação entranha de novo um elemento narrativo potentíssimo: se vencer será o primeiro afro-americano que chega à presidência de um país em cuja fundação pesara decisivamente os grandes proprietários rurais escravagistas, travou uma guerra civil por causa da escravidão e até a década dos sessenta manteve leis segregacionistas.

O talento político de Obama é, diretamente, talento narrativo. Sabe contar sua própria vida e suas idéias como fruto de sua experiência vital e sabe utilizar as historias de vidas, as biografias, como apólogos que lhe servem para discutir e transmitir suas idéias políticas. É o escritor dos dois livros que publicou até agora e é também o escritor de muitos de seus discursos, que ademais se nutrem muito claramente de seus livros e se encaixam como uma luva em sua narrativa. Assim ocorre com seu discurso na Convenção Democrata de 2004, com o qual se fez conhecido em todo os Estados Unidos, com seu discurso de lançamento de sua candidatura presidencial em Springfield em 10 de fevereiro de 2007 ou com uma peça de oratória como seu discurso sobre a raça, já durante a campanha eleitoral, em resposta à crise provocada pelos sermões extremistas de seu mentor espiritual, o pastor Wright. Os ‘ghostwriters’ que trabalham com ele se parecem mais aos negros da oficina de Alexandre Dumas que aos ‘escreventes’ de discursos da maioria dos políticos, normalmente incapazes de escrever diretamente de sua mão uma peça de oratória e menos ainda um livro.

O resultado, ademais de brilhante, é muito útil. Todo Obama está ai. Tudo junto, cada episódio tem seu papel, tudo é coerente; não há que temer que responda a uma influência estranha ou sobrevinda: suas idéias políticas, seu estilo conciliador e dubitativo, sua empatia pelos pontos de vista alheios, incluídos os mais reacionários, o papel da identidade familiar na modelagem da própria vida ou a importância do sentido de pertencer a algo na fabricação da cidadania. Só com uma leve exceção, digna de ser sublinhada: seu itinerário vital é mais radical que suas idéias. A vida de Obama é a de um militante afro-americano, um advogado dos despossuídos, um agitador social e político que decide participar na vida parlamentar e aspira alcançar o máximo poder possível para pôr suas idéias em prática. Suas idéias, ao contrário, muito reflexivas e dialéticas, fruto da discussão e de uma boa capacidade de escuta, são muito moderadas e centristas, movidas quase sempre por um impulso conciliador. Obama não é o negro airado prototípico porque desde muito jovem, provavelmente desde o final de sua adolescência, se esforçou por distanciar sua vida e seu caráter desta imagem negativa.

“A origem dos meus sonhos” é uma excelente narração autobiográfica que interessou ao leitor norte-americano muito antes que seu autor se projetasse na política nacional. A indagação sobre o pai, que abandonou sua família quando o autor tinha dois anos e não voltou a vê-lo, a não ser de forma muito esporádica oito anos mais tarde, se converte ademais numa indagação sobre a identidade afro-americana, ainda na estela de ‘Raízes’, de Alex Haley, a novela que se converteu num seriado televisivo de impacto espetacular em 1977.

“A Audácia da esperança: reflexões sobre a reconquista do sonho americano” escrito ao começar sua carreira de senador em Washington e publicado em 2006, é um livro mais diretamente político, no qual também se percebe o talento pedagógico do professor de direito constitucional e um claro lampejo de ambição presidencial. Num e noutro não faltam alguns episódios pouco convincentes, resolvidos com talento narrativo que não consegue maquiar a vontade de fabricar uma imagem positiva de seu autor: em seu contato com a religião, por exemplo. O mesmo sucede com algum vazio, que já foi destacado, sobre seus anos em Nova York. Mas tampouco faltam episódios de sinal contrario de sincera expressão conflitante, alguns dos quais já foram aproveitados por seus rivais eleitorais. Em ambos há material suficiente para ir confrontando vida e literatura até agora e a partir de agora.

O nome do autor, do artista, é um elemento essencial na obra literária. É a marca que há que vender e que deve encaixar com o que significa. No caso de Obama é uma marca controvertida e discutível, que lhe dá pé também a uma pequena historia. Em setembro de 2001, segundo conta em ‘A Audácia da esperança: reflexões sobre a reconquista do sonho americano’, organizou um almoço com um consultor político que de cara lhe mostrou o quanto havia piorado as coisas para Obama depois do ‘11 de Setembro’: "É realmente muita má sorte. Agora, é claro, você não pode mudar de nome. Os votantes suspeitam deste tipo de coisa. Talvez se estivesse no principio da carreira poderia utilizar um pseudônimo ou algo assim, mais agora ...". Com este nome triunfou na edição e dentro de 72 horas tentará fazê-lo na historia.

Livros

A origem dos meus sonhos – ISBN: 9788573125948;

A Audácia da esperança: reflexões sobre a reconquista do sonho americano (The Audacity of hope: Thoughts on reclaiming the american dream) - ISBN: 9788576352198.

terça-feira, outubro 21, 2008

O Papa freia o processo de beatificação de Pio XII

O Papa freia o processo de beatificação de Pio XII para proteger sua relação com Israel

Setores judeus acusam a Pacelli de fazer vista grossa ao Holocausto
M. ANDRADE / J. M. MUÑOZ – El País - Roma / Jerusalén - 21/10/2008

Tradução de Antonio de Freitas

O processo de beatificação do Papa Pio XII (1939-1958), assunto espinhoso e com ramificações diplomáticas e políticas de profundo calado, aguarda a assinatura de Bento XVI. Porém, tropeçou com um obstáculo que já se esperava: a amarga censura de amplos setores do judaísmo, que acusam a Pio XII de fazer vista grossa ao Holocausto. Ratzinger, que destacou em setembro o trabalho silencioso e secreto de Pio XII em favor dos judeus, optou agora por promover uma investigação mais profunda. Através de seu porta-voz, Federico Lombardi, confirmou que "não assinou ainda o decreto das virtudes heróicas" de Eugenio Pacelli, e que o assunto "está sendo objeto de estudo e de reflexão". Lombarda pediu calma a católicos e judeus.

O Vaticano sabe bem que a figura de Pio XII é objeto de ácidas críticas em Israel, críticas que não somente recaem sobre este Papa. Ontem apareceu numa web de simpatizantes do Kadima – o partido do primeiro-ministro israelense Ehud Olmert - uma fotografia de Ratzinger com uma cruz gamada sobreposta. Horas depois, foi retirada. Lombardi recordou que o Vaticano já protestou quando o Museu do Holocausto de Jerusalém (Yad Vashem) colocou o seguinte texto sob a fotografia de Pio XII: "Quando a relação de fatos sobre o massacre dos hebreus chegou ao Vaticano, não reagiu com protestos escritos ou verbais. Quando os judeus foram deportados de Roma a Auschwitz, Pio XII não interveio... Quando os fornos eram alimentados dia e noite, o Santo Padre que vive em Roma não abandonou seu palácio".

Essa ojeriza, que expressou há duas semanas em Roma o rabino chefe de Haifa, Shear Cohen, convidado especial do pontífice ao sínodo, é o maior obstáculo no processo de beatificação. O Vaticano pede tranqüilidade antes de tomar uma decisão. Lombardi apontou que "nesta situação não é oportuno tentar pressionar nem para um lado nem para outro". Mas, ao mesmo tempo, no passado fim de semana, o relator do processo de beatificação, Peter Gumpel, e o postulador, Paolo Molinari, reavivaram a polêmica pelas "falsidades" lançadas contra o Papa Pacelli. Gumpel afirma que "são uma evidente falsificação histórica" e que Bento XVI "tem em suspenso o processo" porque deseja manter relações amistosas com os judeus.

Tanto Gumpel como Molinari esperam um gesto de Israel. Ambos pedem que a inscrição sobre Pio XII seja retirada do Yad Vashem, e Molinari se queixa: "Prometem que vão mudá-la, porém não fizeram nada". O postulador confirma que Bento XVI espera um sinal de "arrependimento" que acabe com a lenda negra de Pacelli para seguir com o processo. Ratzinger duvida. Teme que a beatificação suscite airadas reações em Israel e nos EUA.

Israel e o Vaticano estabeleceram relações diplomáticas a começos dos anos noventa. Entretanto possuem assuntos pendentes que aprofundam o receio mútuo. As instituições católicas em Jerusalém lamentam que não se resolva a expropriação de terras e outras propriedades, que não desfrutem de isenções fiscais e que os clérigos não disponham de liberdade de movimentos para visitar a Cisjordânia.

O presidente Shimon Peres pretende que Bento XVI marque uma visita oficial a Israel. O processo de beatificação supõe um obstáculo a mais para a organização de uma visita que exige a negociação do protocolo. A maioria dos chefes de Estado e Governo que visitam Israel pára no Museu do Holocausto. É impensável que Bento XVI acuda se a polêmica placa continua exposta.

"Temos razões para pensar que Pio XII não fez o suficiente para salvar vidas judias. Não quero julgar. Se existem evidencias deverão ser examinadas cuidadosamente", afirmou no domingo Peres. "A visita nada tem a ver com as disputas. Esta terra é santa para todos nós". Ainda que com estas palavras, a visita de Bento XVI se vincula à polêmica. O Museu do Holocausto – que sempre pressionou para que o Vaticano abra seus arquivos- expressou-se com cautela. "Qualquer visita do Papa a Israel seria um assunto político do que o Yad Vashem não é parte". "Estamos convencidos de que a abertura dos arquivos ajudaria a clarificar este episódio histórico".

As razões do silêncio

HILARI RAGUER
Historiador e monge de Montserrat

El País - 21/10/2008

Tradução de Antonio de Freitas

Os apologistas de Pio XII o absolvem de toda responsabilidade por seu silêncio sobre o Holocausto alegando que foi um mal menor, pelas represarias terríveis que a denuncia haveria provocado. Porém, cabe imaginar um mal maior que o extermínio que já se estava dando? Conseqüências piores podiam ocorrer, em todo caso, não para os judeus, mas para o Papa, talvez com a ocupação militar do Vaticano. Pio XI havia sido muito valente ao denunciar as leis raciais fascistas de 1938. Paulo VI, para defender a Pio XII, desobedecendo aos prazos habituais, mandou publicar a documentação vaticana daqueles anos (Actes et documents du Saint-Siège relatifs à la seconde guerra mondiale, Libereria Editrice Vaticana, 1965-1981), mas destes documentos e das notas do editor se depreende que importantes documentos foram ocultados. Dizia o P. Anselm Albareda, diretor da Biblioteca de Montserrat e também da Vaticana, que quando se recortam documentos sempre ficam filagarses (resíduos). A obra, a meu entender, mais ponderada sobre esta questão é a do historiador Renato Moro, sobrinho de Aldo Moro, ‘La Iglesia y el exterminio de los judeus. Catolicismo, antisemitismo, nazismo’ (Desclée de Brouwer, Bilbao, 2004).

Acredito que no ânimo de Pio XII pesaram duas importantes razões. A primeira é sua conhecida simpatia pela Alemanha, ainda que certamente não pelo nazismo. As informações sobre o extermínio eram tão espantosas que a principio pareciam inacreditáveis. Quando Pio XII recebeu testemunhos múltiplos e irrefutáveis a guerra estava já inclinada francamente para o lado dos aliados e é provável que o Papa negasse a somar-se à propaganda que estes estavam fazendo contra o nazismo, como se temesse ser qualificado de oportunista ao somar-se ao lado vencedor.

A cada vez mais inevitável derrota alemã motivava ainda outra razão para o silêncio do Papa. A política de Pio XII (a italiana e a internacional) esteve sempre presidida por uma obsessão anticomunista. Seu grande projeto, ainda que não pudesse promovê-lo abertamente, era evitar a derrota da Alemanha para que esta pactuasse a paz com a Grã- Bretanha e se lançassem ambas contra a União Soviética. Não era fácil, porém uma condenação do nazismo houvesse feito metafisicamente impossível.

quarta-feira, outubro 15, 2008

O livro digital vencerá o de papel em 10 anos

O livro digital vencerá o de papel em 10 anos

Uma pesquisa entre mil profissionais estabelece o ano de 2018 para a superação do suporte tradicional - A censura na Turquia marca o inicio da Feira de Frankfurt

G. ALTARES / C. GELI – El País - Francfort - 15/10/2008

Tradução de Antonio de Freitas

Ninguém diria pela quantidade de caminhões que ontem descarregavam na Feira de Frankfurt toneladas dessa mescla de pasta de celulose e tinta que formou nosso mundo e que chamamos livros. Porém, nunca até agora o mundo digital teve tanta importância. A principal feira do livro do mundo, que inaugurou oficialmente na noite de ontem e que hoje abre suas portas aos negócios durante cinco dias, começou sob a sombra de uma pesquisa a 1.000 profissionais do setor de 30 países cuja principal conclusão é que, dentro de uma década, em 2018, os livros eletrônicos em qualquer dos formatos imagináveis superarão em volume de negocio aos herdeiros da galáxia Gutenberg.

Portanto, na edição deste ano da feira, a 60ª, que conta com a Turquia como país convidado e a que tem previsto assistir 7.000 expositores de 101 países e cerca de 1.000 autores - uma cifra praticamente idêntica à do ano passado-, os livros clássicos no representam já mais que 42% do volume total frente à avalanche de seus parentes digitais, DVD, áudio livros e os novos reprodutores, com o Kindle de amazon.com e o leitor da Sony á frente.

O escritor brasileiro Paulo Coelho, um dos autores mais populares, que receberá hoje uma homenagem em Frankfurt após superar os 100 milhões de exemplares vendidos, asseguro na inauguração da feira que havia começado a predicar com o exemplo e que postou na sua página web uma cópia gratuita de seu livro mais famoso, O Alquimista, dado que, já circulavam cópias piratas pela Internet. "O primeiro ano, as vendas passaram de 1.000 a 10.000 cópias. No segundo, subiram até as 100.000. Até o dia de hoje, vendeu 10 milhões de livros na Rússia", afirmou. "Durante 15 séculos, o livro tradicional demonstrou ser insuperável. Porém os livros digitais estão reclamando seu espaço e tudo indica que chegará um momento no qual o digital superará o de papel. Mas se necessitam, todavia, uns quantos anos, o que nos dá - aos editores, autores e escritores - um tempo precioso antes que a Internet nos alcance", prosseguiu o autor.

As quatro principais conclusões da macropesquisa encarregada pela feira revelam que os editores compartem o otimismo de Coelho, isto é, que a indústria pode sobreviver à avalanche digital, ainda que a mudança de cenário será brutal: a influencia da China na edição digital se multiplicará por três nos próximos anos (atualmente EUA domina o mercado); os consumidores, Google e Amazon impulsionarão a mudança digital; os e-livros superarão aos livros tradicionais em 2018 (segundo a opinião de 40% dos entrevistados, frente a 30% que considera que isto nunca ocorrerá) e a venda de livros por Internet foi escolhida como o acontecimento mais importante no mundo da edição nos últimos 60 anos, os mesmos que cumpre agora a feira.

Contudo, a mesma pesquisa demonstra que, todavia falta um longo caminho antes de chegar a um industrial e voluntario Fahrenheit 451: 60% dos editores não utilizam ainda livros digitais nem os novos suportes, e quase ninguém (7%) acredita que os e-livros serão sua principal fonte de ingressos dentro de cinco anos. Assim, os preparativos da feira ofereciam ontem pela manhã uma imagem surrealista: três operários descarregavam com dificuldade, até o pavilhão que ocupava Alemanha, uma linotipo, a mesma imagem do passado numa feira que se lança até outra era e que em promoção começa a mudar o logo ‘Book Fair’ para ‘Media Fair’.

Porém muitos editores compartilham uma preocupação muito mais terrena: Em que medida a crise global pode chegar a afetar o setor do livro? De momento, alguns editores espanhóis consultados asseguravam que começavam a notar uma ligeira baixa de vendas nos títulos de pequena tiragem, ainda que a dos grandes nomes se mantêm. Por fim, o diretor da Feira do Livro, Juergen Boos, se mostrou todo o tranqüilizador que pode. "O setor do livro segue suas próprias regras, incluso frente a uma crise financeira internacional", assinalou. "Isto ficou demonstrado num estudo das principais editoras alemãs. Ainda que haja tantos pessimistas como otimistas entre os que responderam, a opinião majoritária era que a situação econômica dos editores seguirá sendo consistente. Os livros parecem ser muito resistentes aos ciclos econômicos negativos, o que deixa claro o fato de que são bens necessários, não de luxo".

As cifras, uma vez mais, jogam a favor de Boos: o número de títulos expostos (402.284) e o de novas publicações (123.496) é claramente superiores à passada edição da Feira de Frankfurt. No papel ou em bit, a coisa segue.

Pamuk, sempre desafiante

O prêmio Nobel de Literatura Orhan Pamuk e o presidente islâmico moderado da Turquia, Abdulá Gül, ofereceram na noite de ontem, na inauguração da Feira do Livro de Frankfurt, suas visões contrapostas deste país, convidado de honra este ano. Foi um exercício dialético apaixonante que demonstrou as feridas abertas de um Estado-ponte entre Oriente e Ocidente e submetido a uma dialética entre a tradição e a modernidade que lhe faz caminhar muitas vezes pelo fio da navalha. Os dois foram ao limite de suas possibilidades. "Um século de proibir e queimar livros, de mandar aos escritores à prisão ou assassiná-los como traidores ou enviá-los ao exílio. Denegri-los constantemente nos meios de comunicação não serviu para enriquecer a literatura turca, só a fez mais pobre", assinalou o autor de Neve.

Logo, em meio de um grande aplauso, se lançou diretamente contra a instituição que encarna o presidente turco, que se encontrava a somente uns metros dele, sentado junto a sua esposa, que luzia o lenço muçulmano. "O costume do Estado de penalizar os escritores e seus livros segue muito viva: o artigo 301 do Código Penal é utilizado ainda em silencio para suprimir a muitos outros escritores, da mesma forma em que foi utilizado contra mim", disse Pamuk.

O presidente Gül, por outro lado, começou seu discurso com um chamativo elogio da figura de Pamuk e uma descrição de seu país totalmente diferente. "As restrições aos autores se reduziram ou desapareceram. A Turquia se converteu num Estado em que prevalece a liberdade de opinião e de expressão", manifestou.

segunda-feira, outubro 13, 2008

Krugman ganha o Nobel de Economia


Krugman ganha o Nobel de Economia

A academia sueca premia o estadunidense por sua análise dos padrões de comércio e localização da atividade econômica

AGENCIAS – El País - Estocolmo - 13/10/2008

Tradução de Antonio de Freitas

O estadunidense Paul Krugman ganhou hoje o Prêmio Nobel de Economia por sua análise dos padrões de comércio e a localização da atividade econômica, segundo informou a Real Academia Sueca de Ciências. Krugman, de 55 anos, é professor de Economia e Assuntos Internacionais na Universidade de Princeton (EUA) e destacou-se por ser crítico das políticas econômicas neoliberais do presidente George W. Bush.

A Academia reconheceu seus trabalhos sobre comercio internacional que o levou a desenhar uma "nova geografia econômica" e uma "nova teoria do comercio". Krugman foi premiado em 2004 com o ‘Príncipe de Asturias de las Ciencias Sociales’. Ademais, em 1991, a Associação Econômica Americana lhe concedeu a medalha John Bates Clark.

Crítico com o sistema

Autor de mais de 200 artigos e uma vintena de livros, Krugman é também colunista habitual do ‘The New York Times’. Sua obra ‘Economia Internacional: A teoria e a política’ é um livro de referência nesta disciplina. Em O Grande Engano (2003), uma recopilação de seus artigos jornalísticos, denuncia a submissão do sistema político, judicial e econômico estadunidense à extrema direita.

"Vou tomar uma banho para depois oferecer uma coletiva de imprensa; telefonei a meus pais e a minha esposa, porém ainda não tive tempo de tomar uma xícara de café", afirmou por telefone o economista nova-iorquino após conhecer a noticia.

O anúncio do Nobel de Economia encerra o ciclo destes prêmios, que começou na segunda-feira da semana passada (06 de outubro) com o de Medicina. O prêmio está dotado com dez milhões de coroas suecas (um milhão de euros) e será entregue no dia 10 de dezembro, aniversario da morte de Alfred Nobel.

quarta-feira, outubro 08, 2008

Uma única nação cultural


Uma única nação cultural

Felipe González e William Ospina dialogam sobre o grande valor ibero-americano

JAVIER LAFUENTE – El País - Madrid - 07/10/2008

Tradução de Antonio de Freitas

É possível que a política e a economia tenham conseguido distanciar a Espanha da América Latina, ou vice-versa, durante os últimos 200 anos. Destarte o escritor colombiano William Ospina sustenta que só através da cultura se pode romper essa divisão. "Assim, somos uma nação e não 20 nações; é nossa riqueza continental", remarcou ontem durante a apresentação em Madri do ‘Festival VivAmérica’ junto ao ex-primeiro ministro espanhol Felipe González e à secretária de Estado para Ibero-américa, Trinidad Jiménez.

Para González, a cultura é "a única dimensão de potência global" que une a Espanha aos países ibero-americanos. O poeta colombiano, defensor da América Latina como o epicentro da primeira grande globalização, disse que, há dois séculos, os líderes da independência não se esforçaram tanto por romper com a Europa, mas por "romper com uma Espanha não suficientemente moderna nem européia". Agora, 200 anos depois, o desafio interno da região e sua relação com a Espanha "não passa por ser idênticos: há que dialogar".

"Ali começou a globalização", insistiu Ospina. A razão: a região possui elementos de muitas culturas de diversas partes do mundo que, com o tempo, lograram arraigar-se e formar uma cultura comum. "Não basta uma invasão militar, uma conquista, para que uma língua se arraigue e se converta em algo mais íntimo", matizou o ensaísta. Aqui está a grande riqueza continental de cultura ibero-americana. "Ainda que a [Jorge Luis] Borges lhe acusassem de ser muito europeu, na realidade é muito latino-americano, muito argentino; o que ocorre é que Argentina é o país dos emigrantes".

O bicentenário da independência que vários países celebram entre 2008 e 2010 foi o motivo do encontro que mantiveram Ospina e González e que lançou o ‘Festival VivAmérica’, que se celebra esta semana com mais de 250 atividades culturais em Madri, Bogotá e Tenerife.

Partindo da dificuldade que, como reconheceram, leva a avaliar estes dois séculos de independência, de ver os logros que se conseguiu e os desafios do futuro, com relação a estes últimos, Felipe González remarcou a necessidade de romper uma inércia que sobrevive na região: "Se vive de costas ao vizinho e de cara ao mundo". Ou o que é o mesmo: as relações entre os países da América Latina são praticamente nulas ou, quando muito, complicadas. "Uma estrada integra mais que 20 discursos ideológicos", asseverou o ex primeiro ministro espanhol.

Para Ospina, o Bicentenário servirá para valorar "não só o que passava há 200 anos, mas também o que passou durante estes dois séculos". Avaliar os logros e as tarefas pendentes não será simples. Para isso, haverá que colocar a vista atrás, mas também para frente, "perspectiva e prospectiva", enfatizou o ensaísta colombiano, que recordou que "sempre foi mais fácil falar de amor, fraternidade e igualdade na França da Revolução que na América dos escravos". Ademais desta e outras reflexões, Ospina confia que a efemérides possa cumprir uma dívida histórica da região: a incorporação da cidadania ao sistema. "O maior problema que temos não é que haja guerrilhas ou paramilitares, mas uma cidadania incapaz de parar tudo isso".

quinta-feira, outubro 02, 2008

Homer Simpson tenta votar em Obama... porém a máquina escolhe McCain

O capítulo de 2 de novembro dos Simpson oferecerá uma antecipação das eleições no seu capítulo especial de Halloween

ELPAÍS.com / EFE - Madrid / San Francisco - 02/10/2008

Tradução de Antonio de Freitas

Já ficou clara a preferência de Robert De Niro, Leonardo Di Caprio e Scarlett Johansson pelo candidato democrata à Casa Branca. Porém, Barack Obama ganhou um novo fã. Trata-se de Homer Simpson, o patriarca da família mais estrambótica de Springfield, que em 2 de novembro, dois dias antes do dia real das eleições, tentará votar em Obama, ainda que finalmente acabará devorado por uma máquina que prefere McCain.

No YouTube (em inglês) se pode ver um fragmento do capítulo que a cadeia estadunidense Fox emitirá 48 horas antes da jornada eleitoral e dois dias depois do Halloween. Nele, as eleições chegam a Springfield. Como todo cidadão responsável Homer Simpson se acerca até seu colégio eleitoral para votar em seu candidato favorito. Sua preferência é clara: "Quero votar em Obama", diz risonho diante de uma das máquinas eleitorais que recolhem, mediante um monitor táctil, o voto dos cidadãos. Contudo, o aparato marca até seis votos para John McCain quando Simpson tenta furibundo que se registre seu voto corretamente.

Al Jean, produtor executivo dos "Simpsons", disse ao diário estadunidense Orlando Sentinel que a cena não pretende ser uma declaração de apoio a Obama, mas "um comentário sobre as irregularidades do sistema de voto" nos EUA.

sábado, setembro 27, 2008

Paul Newman falece aos 83 anos


Paul Newman falece aos 83 anos

O porta-voz do ator estadunidense confirmou sua morte

MIGUEL MORA / ELPAÍS.com - Roma / Madrid - 27/09/2008

Tradução de Antonio de Freitas

O ator estadunidense Paul Newman morreu aos 83 anos de idade de acordo com a confirmação de seu porta-voz a agencia Reuters. A noticia foi adiantada esta tarde pela Fundação Dynamo Camp Limestre, fundada pelo próprio Newman.

Vincenzo Manes, presidente da Fundação Dynamo Camp Limestre, com sede em Pistoia (Itália) confirmava esta tarde a morte do mítico ator, diretor e produtor estadunidense. "Esta manhã recebi um e-mail da América no qual me disseram que Paul Newman já não está conosco", disse Manes. Segundo pode saber EL PAÍS, o e-mail procedia de uma pessoa próxima ao ator que trabalha para a fundação Hole in the Wall, também dedicada às crianças enfermas.

Em agosto passado, o ator, afetado por um câncer de pulmão, pediu a sua família que lhe levasse para casa para morrer. Newman recebeu vários tratamentos de quimioterapia no Hospital de Nova York e passou seus últimos dias com sua mulher, Joanne Woodward, e suas filhas. De acordo com fontes próximas à família, o ator passou suas últimas semanas pondo em ordem suas coisas. O ator tinha três filhas com Woodward, com quem contraiu matrimonio em 1958, e duas mais de um matrimonio anterior com Jackie Witte.

Newman deixou o cinema em 2007, apenas uns meses antes de que se fizesse pública a noticia de sua enfermidade, com mais de 60 filmes em sua carreira que lhe valeram um Oscar Honorífico em 1985. Um ano depois, receberia o Oscar de Melhor Ator por sua interpretação em 'A cor do dinheiro'.

Detetive, gângster, malandro, general, vaqueiro, jogador de bilhar ou de hóquei sobre o gelo, projetista de arranha-céu, cientista, intrépido capitão de barco, assaltante de trens e bancos, Buffalo Bill ou Billy The Kid, Paul Newman percorreu todos os papeis possíveis em seus 56 filmes. Nessa meia centena de longa-metragens cortejou e beijou às mulheres mais desejadas de Hollywood, desde Liz Taylor a Sofía Loren, Eva Marie Saint ou Elke Sommer, e trabalhou sob as ordens de diretores como Michael Curtiz, Otto Preminger, Alfred Hitchcock, John Huston, Robert Altman, Martín Scorsese ou os irmãos Coen.

Sua carreira esteve repleta de prêmios entre os quais figuram um Oscar Honorífico em 1985, outro de melhor ator por 'A cor do dinheiro', em 1986, e o Prêmio Humanitário Jean Hersholt, também da Academia de Hollywood, em 1993, ademais de ter sido candidato à apreciada estatueta em múltiplas ocasiões. Mesmo assim, entre outros galardões obteve quatro Globos de Ouro Melhor ator de elenco de série, em 2006; Prêmio Cecil B. De Mille em 1984; Melhor diretor por 'Rachel, Rachel', em 1969, e Globo de Ouro de estrela revelação do ano de 1957 por 'O cálice de prata').

Por outro lado, o ator também ficou muito conhecido por sua desbordante aficionado pelas corridas de automóveis. De fato, Newman participou profissionalmente em algumas delas, enquanto, ao mesmo tempo, montou diversos negócios relacionados com a cozinha e a alimentação, dos quais, em ocasiões, destinou parte dos lucros a obras de solidariedade.

Principais filmes com o ator:

"O Cálice Sagrado" (1954),"Marcado pela Sarjeta" (1956), "Deus É Meu Juiz" (1956), "Com Lágrimas na Voz" (1957), "Famintas de Amor" (1957), "O Mercador de Almas" (1958), "Um de Nós Morrerá" (1958), "Gata em Teto de Zinco Quente" (1958), "A Delícia de um Dilema" (1958), "O Moço da Filadélfia" (1959), "Paixões Desenfreadas" (1960), "Exodus" (1960), "A Vida é um Jogo" (1961), "Paris Vive à Noite" (1961), "Doce Pássaro da Juventude" (1962), "As Aventuras de um Jovem" (1962), "O Indomado" (1963), "Amor Daquela Espécie" (1963), "Os Criminosos Não Merecem Prêmios" (1963), "A Senhora e seus Maridos" (1964), "Quatro Confissões" (1964), "Lady L" (1965), "Caçador de Aventuras" (1966), "Cortina Rasgada" (1966), "Hombre" (1967), "Rebeldia Indomável" (1967), "Que Delícia de Guerra" (1968), "500 Milhas" (1969), "Butch Cassidy" (1969), "A Sala dos Espelhos" (1970), "Uma Lição para Não Esquecer" (1971), "Meu Nome é Jim Kane" (1972), "Roy Bean, o Homem da Lei" (1972), "O Emissário de MacKintosh" (1973), "Golpe de Mestre" (1973), "Inferno na Torre" (1974), "A Piscina Mortal" (1975), "O Oeste Selvagem" (1976), "A Última Loucura de Mel Brooks" (1976), "Vale Tudo" (1977), "Quinteto" (1979), "O Dia em que o Mundo Acabou" (1980), "Os Apaches do Bronx" (1981), "Ausência de Malícia" (1981), "O Veredito" (1982), "Meu Pai, Eterno Amigo" (1984), "A Cor do Dinheiro" (1986), "O Início do Fim" (1989), "Blaze, o Escândalo" (1989), "Mr. & Mrs. Bridge - Cenas De Uma Família" (1990), "Na Roda da Fortuna" (1994), "O Indomável - Assim É Minha Vida" (1994), "Fugindo do Passado" (1998), "Uma Carta de Amor" (1998), "O Grande Golpe" (2000), "Estrada Para Perdição" (2002), "Carros" (2006) - voz para o personagem Doc Hudson.

segunda-feira, setembro 22, 2008

A herança econômica

A herança econômica

Joaquín Estefanía – El País - 22/09/2008

Tradução de Antonio de Freitas

As últimas medidas tomadas pelo governo Bush para salvar às finanças determinarão a herança econômica que receberá o novo presidente dos EUA. O patrimônio ‘neocon’ (essa "categoria zumbi", como recordava nestas mesmas páginas o filósofo Jorge Urdánoz citando a Ulrich Beck) em matéria econômica não pode ser mais catastrófico para as contas públicas e mudou as regras do jogo.


Pendentes da letra pequena desse pacote de auxilio - que custará "bilhões de dólares" segundo o Secretário do Tesouro-, se pode elaborar um primeiro balanço da intervenção governamental no setor financeiro, durante o último ano.

Até agora gastaram mais de 900 bilhões de dólares em ajudas concedidas pelo governo estadunidense para refinanciar e dar garantias às hipotecas com risco de inadimplência, em tomar o controle da seguradora AIG e das agencias Fannie Mae e Freddie Mac, em liquidez aos bancos em forma de empréstimos, no crédito a Morgan Stanley para adquirir Bearn Stearn, etc.

A nova agência anticrise que ficará com as hipotecas tóxicas limpando o balanço dos bancos, o fundo de estabilização, etc, anunciados na sexta-feira passada, custarão ao menos outros 700 bilhões de dólares. Em definitiva, cerca de 1,6 trilhões de dólares.

Ainda que sejam quantidades heterogêneas (e em parte susceptíveis de devolução), supõem ao redor de 15% do PIB americano, o que terá enormes conseqüências no déficit e na dívida pública do país. Para mais de uma geração. O Congresso dos EUA, que tem que elevar a capacidade de endividamento do governo americano, enfrenta a um interessante dilema: ainda que, a curto prazo, estes auxílios tenham efeitos positivos no sistema financeiro privado, sua contribuição negativa aos desequilíbrios macroeconômicos gerais subordinará a política econômica do sucessor de Bush.

Porém, ademais dos grandes números, a política ‘neocon’ mudou as regras do jogo da economia de mercado: seu relato econômico neoliberal foi acompanhado da maior intervenção pública conhecida para salvar o capitalismo, desde os tempos de Roosevelt e seu ‘new deal’ nos anos trinta.

Todos os tópicos que denunciavam a hipocrisia do discurso neocon se tornaram realidade ao mesmo tempo: saneamento público das perdas privadas; privatização de lucros e socialização de perdas... E tudo isto, de modo que pareça irremediável: "O risco de não atuar seria muito maior, mais pressão sobre nossos mercados financeiros causariam perdas massivas de emprego, devastariam as contas de poupança e pensões, corromperão ainda mais o valor das casas e secariam a fonte dos empréstimos para novas casas, carros e estudios. São riscos que os americanos não podem se permitir" (Bush).

Contam os cronistas que a economia se fez dona da campanha eleitoral. Em principio, parece que o inferno financeiro desgasta mais a McCain por sua vinculação ao mesmo partido que o responsável final da situação, por sua ignorância confessa nestes assuntos e porque seu principal assessor econômico, até ser despedido, o senador Gramm, é o que deu nome a uma lei de 1999 (a Lei Gramm-Leach-Blieley) que rompeu as fronteiras entre a banca de investimento e a banca comercial, e deu asas a uma zona de sombras para a primeira, que é a que permitiu o escândalo das ‘hipotecas subprime’.

Obama rodeou-se por uma equipe de assessores que é a mesma que protagonizou a etapa mais larga de prosperidade na historia econômica do país, coincidentemente com as duas legislaturas democratas de Bill Clinton, e condiciona seu apoio ao resgate a um plano de estímulo geral, que define com muita inteligência: não socorrer somente a Wall Street (as finanças), mas também a Main Street (a economia do cidadão comum).

Três quartos de século depois de Roosevelt, o Estado volta à economia e, paradoxos da historia, a realidade reconhece que Keynes tinha razão: para salvar a um país de uma grande crise econômica se requer do dinheiro público e da política fiscal. Isto é, o contrario do que disse Reagan e seus sucessores desde princípios dos anos oitenta. Voltarão a nos enganar?: Tentarão.

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Joaquín Estefanía

De Wikipedia, la enciclopedia libre

Joaquín Estefanía Moreira (Madrid, 1951) es un periodista español.

Biografía


Licenciado en Ciencias Económicas y en Periodismo por la
Universidad Complutense de Madrid, comenzó su actividad profesional en 1974 como redactor en el Diario Informaciones; poco después pasa a ser jefe de la sección de economía de la revista Cuadernos para el diálogo y redactor jefe del diario económico Cinco días.
Más adelante se incorpora al Diario
El País, del que llegó a ser director entre 1988 y 1993 y de 1993 a 1996 director de publicaciones del Grupo PRISA. Continúa escribiendo una columna sobre economía en el Diario El País.
Ha escrito varios libros de contenido económico.

Libros publicados
La nueva economía: una exposición para comprender, un ensayo para reflexionar (1995).
La nueva economía: la globalización (1996),
El capitalismo (1997),
Contra el pensamiento único (1998),
Aquí no puede ocurrir: el nuevo espíritu del capitalismo (2000),
El poder en el mundo (2000).
Diccionario de la nueva economía (2001).
Hij@, ¿Qué es es la globalización? (2002).
La cara oculta de la prosperidad (2003).
La mano invisible (2006).
La larga marcha: medio siglo de política (económica) entre la historia y al memoria (2007).