Os Estados limítrofes negociam a divisão do Pólo,
rico em petróleo e vital para as comunicações
C. GALINDO / AGENCIAS – El País - 28/05/2008
Tradução Antonio de Freitas
Cinco países iniciaram dia 27 de maio entendimentos para repartirem entre si o Ártico, uma das últimas zonas da Terra que ainda não tem como dono nenhum Estado e que se calcula que alberga sob o gelo a quarta parte das reservas mundiais de petróleo. Dinamarca, anfitriã do encontro, deseja que os Estados Unidos, Noruega, Canadá e a Rússia acatem as regras do jogo estabelecidas pelas Nações Unidas em 1982, para levar a cabo um eventual reparto. "Esta reunião é o principio de um processo que pode durar anos", afirma numa entrevista telefônica Lars Kullerud, presidente da Universidade do Ártico, uma rede internacional de universidades com sede nessa região.
Está em jogo 1,2 milhão de quilômetros quadrados de fundo marinho que ficou atraente para alguns graças à mudança climática. O degelo facilita um maior acesso às bolsas de hidrocarbonetos e abre novas rotas marítimas, que permitem uma economia de até 8.600 quilômetros numa viagem entre Tóquio e Hamburgo. Os cinco países limítrofes querem assegurar, o quanto antes, uma parte do bolo e seus ministros apresentarão suas demandas durante a reunião de três dias que começou no dia 27 de maio em Ilulissat, uma pequena cidade da Groenlândia que tem o maior glaciar do mundo.
As bases para um acordo estão sentadas. "Trata-se de um passo importante, porque as partes sentam na mesma mesa para reconhecer que existe um desacordo, para cooperar em alguns âmbitos e, quiçá, começar a encontrar uma solução para o problema da soberania", diz Pablo Pareja, Professor de Relações Internacionais da Universidade Pompeu Fabra, Espanha, e autor de um estudo sobre o Ártico. "O Ártico é um espaço ainda não dominado. Tradicionalmente foi considerado alto mar", completa.
A região ártica, na qual vivem sobre uma enorme casca de gelo entre dois e quatro milhões de pessoas, se converteu nos últimos anos em objeto de disputa. O Direito Internacional, plasmado na Convenção sobre o Direito do Mar das Nações Unidas, estabelece que os países com saída ao mar tem direito a estender sua zona de soberania em até 200 milhas náuticas (370 quilômetros) desde a costa. Porém, este limite pode se ampliado, caso um país demonstre que sua plataforma continental, que é o leito marinho anexo ao continente, vai além dessa distância.
Esta exceção abriu as portas para reclamações. Para provar que suas demandas estão fundamentadas, vários países organizaram expedições cartográficas para reivindicar o maior território possível. O momento mais tenso aconteceu no ano passado, quando uma equipe russa, num submarino, plantou uma bandeira do país no fundo marinho.
A resolução do conflito pode durar anos, entre 10 e 15, segundo o governo dinamarquês. Os Estados Unidos ainda não ratificaram o tratado da ONU (firmado em 1982 e em vigor desde 1994) e, até que não o façam, o litigio não se encerrará. "Uma vez adotado o tratado, há um prazo de 10 anos para propor reivindicações e, ainda que Washington o assine em breve, como parece provável, ainda terá essa década para protestar", explica Lars Kullerud.
"Todo o mundo está esperando pelos Estados Unidos", conclui o presidente da Universidade do Ártico. Um dos objetivos da reunião de Ilulissat é que todos se comprometam a respeitar dito tratado.
Num mundo que explora ao máximo seus recursos naturais, o Ártico é uma das poucas zonas que permanecem virgens. Uns 25% das reservas desconhecidas de petróleo e gás estão sob estas águas. Escavar para chegar até o petróleo não esteve, até agora, ao alcance das petroleiras, porém a mudança climática tornou mais fina a capa de gelo, enquanto a tecnologia melhorou muito. A operação pode ser, neste momento, muito cara, porém com o barril do brent a 130 dólares extrair petróleo do Ártico pode resultar rentável.
O ouro negro não é a única vantagem de ser proprietário de uma porção desta zona. "Com o degelo se pode abrir uma via de navegação permanente pelo norte e ter acesso a uma via como esta é chave para países como os Estados Unidos, que agora tem que chegar ao outro lado do mundo através do estreito de Malaka (na Ásia), o cabo de Agulhas (na África do Sul) e o cabo de Hornos (na América Latina)".
Há duas passagens, a do nordeste (não navegável), e a do noroeste, que se abriu durante uns meses pela primeira vez em 2007. Os pesquisadores calculam que os barcos poderão utilizar esta última passagem durante todo o ano a partir de 2050, graças à mudanças climática.
As ONGs pediram que os países limítrofes cheguem a um acordo que dê garantias ambientais ao Ártico, uma proposta com a qual coincidem alguns países que estão fora da disputa, como França e Espanha.
Reservas de petróleo - Uns 25% das reservas de petróleo e gás natural por descobrir estão no Ártico. Rotas comercias - A passagem do Nordeste não é navegável, enquanto que a passagem do noroeste já está aberta vários meses ao ano, e se prevê que a partir de 2050 esteja em funcionamento durante todo o ano. Através da passagem do noroeste, entre Tóquio e Nova York há 14.000 quilômetros; se o recorrido passa pelo canal do Panamá, são 18.200. População – No Ártico vivem entre dois e quatro milhões de pessoas, repartidas entre Canadá, Dinamarca, Noruega, Rússia e os EUA, incluídos mais de 20 grupos indígenas.